NOTA PÚBLICA
MANIFESTAÇÃO DE 19 DE SETEMBRO EM LUANDA
A Associação OMUNGA tomou conhecimento que um grupo de jovens que se intitula de Movimento Revolucionário, está a organizar uma manifestação para 19 de Setembro, em Luanda, a partir das 15 horas no Largo da Independência.
Enquanto uma associação de promoção dos Direitos Humanos e com o Estatuto de Observador da Comissão Africana dos Direitos do Homem e dos Povos, a OMUNGA avaliou todos os procedimentos desenvolvidos pelos organizadores, no que se refere:
1 – O Direito à Manifestação é um direito elementar constante na Declaração Universal dos Direitos Humanos, no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e na Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos, diplomas internacionais de Direitos Humanos reconhecidos pelo Estado de Angola;
2 – Os organizadores aparecem devidamente identificados através dos seus nomes e localização (cinco assinaturas legíveis e seus contactos telefónicos);
3 – Os organizadores endereçaram a devida correspondência ao governo provincial de Luanda a informar sobre a intenção da realização da manifestação de forma atempada e dentro da preceituada legalidade (a carta deu entrada no Governo Provincial de Luanda a 2 de Setembro de 2013);
4 – Os organizadores especificaram objectivo, lema, horário e local (a partir das 15 Horas de 19 de Setembro de 2013 no Largo da Independência em Luanda);
5 – Os organizadores fizeram a devida divulgação, embora não tenha sido visível nos órgãos de comunicação social públicos;
6 – O Governo Provincial de Luanda não apresentou, até à data, qualquer posicionamento que denuncie irregularidades ou ilegalidade da aqui referenciada intenção de organização deste acto público;
7 – Entretanto, de acordo a registos a que a OMUNGA teve acesso, Ernesto Bartolomeu, apresentador num principal serviço noticioso da TPA, o telejornal, inicia esta informação: “Enquanto no centro de conferências de belas, os jovens comprometidos com o futuro de Angola exprimiam livre e democraticamente os seus pensamentos, uns criticando, outros apresentando sugestões para a melhoria dos trabalhos em curso, há gente contra a paz e a estabilidade de Angola, um deles foi detido em flagrante!”;
8 – Em off, logo de seguida com imagens de polícias em posição de sentido, ouve-se: “A polícia nacional chamou a imprensa para esclarecer a detenção de alguns jovens que tentavam realizar uma manifestação sem autorização”;
9 – O sub-comissário Aristófanes dos Santos, porta-voz da polícia Nacional declara: “Há uma série de jovens que pretendem fazer manifestações sem que para tal estejam devidamente autorizados, sem que se enquadrem na letra e no espírito da lei sobre o direito à reunião e manifestação.” Continua “É assim que nesta altura temos dois jovens detidos e como vocês vêem, propagandas como estas que constam nestes escritos são susceptíveis de alterar a ordem e a segurança pública. Nós não podemos enquanto forças e serviços de segurança públicas, permitir que cidadãos nacionais ou estrangeiros coloquem estes dizeres, insultem o mais alto magistrado da Nação, a sua ex.ª o sr. presidente da República, porque, nós temos que perceber que a nível do plano interno e no plano externo, quem representa a Nação é o presidente da República. A ele merecemos respeito e consideração”
10 – Enquanto isso apresentava uma camisola branca na qual se viam timbradas a negro as seguintes frases: “POVO ANGOLANO QUANDO A GUERRA É NECESSÁRIA E URGENTE EM ANGOLA PARA MUDARMOS O GOVERNO DITADOR”
11 – Continuou a defender: “e reparem que mesmo nos termos da lei sobre o direito de reunião e de manifestação, é mesmo no artigo 4.º, número 1 que refere que o exercício do direito à reunião e manifestação não afasta a responsabilidade pela ofensa à honra e consideração devidas às pessoas e aos órgãos de soberania.”
12 – Em off, o jornalista afirmava: “no entender da polícia, não passou de uma acção de incitação à guerra pondo em causa a ordem e tranquilidade públicas” para em seguida o porta-voz da polícia nacional declarar “o que ocorre aqui é uma situação grave de incitamento à violência, é um desacato à autoridade policial e a polícia nacional alerta, o comando geral da polícia nacional alerta a todos os cidadãos no sentido de não acatar, de não enveredarem por esse tipo de acções na via pública sobretudo, sob pena de nós termos de efectuar as detenções e fazê-los presentes aos tribunais.”
13 – Em seguida, o porta-voz da polícia nacional declara: “é preciso perceber que quem coloca estes panfletos, estes dizeres que atentam contra o mais alto magistrado da Nação é uma pessoa que comete actos de delinquência.”
14 – Em off, o jornalista conclui: “um dos acusados vai ser encaminhado ao Ministério Público.” Ernesto Bartolomeu acrescenta: “esta é precisamente a informação que nos acaba de chegar, é que um deles já foi encaminhado para a justiça.” Continua “quem directamente ou indirectamente sofreu os efeitos da guerra condena de forma enérgica a posição tomada por alguns destes jovens que insistem na promoção de desordem social” para depois passarem entrevistas.
15 – Já em trabalho emitido a 13 de Setembro de 2013 na RNA, em que o jornalista declara “foi já detido pela polícia nacional, segundo o porta-voz Aristófanes dos Santos, a tendência de manifestação pública desencaminhada por grupos de jovens põe em causa o poder legalmente instituído.”
16 – De seguida, aparece o sub-comissário Aristófanes dos Santos, porta-voz da polícia Nacional, a declara ilegalidade sobre citadas manifestações, apresentando como argumentação: “O comando geral da Polícia Nacional está preocupado porque tomou conhecimento de alguma tendência de manifestações públicas por parte de grupos de jovens que com alguma irresponsabilidade e alguma inadvertência pretendem-se manifestar-se publicamente pondo em causa o poder legalmente instituído…” e mais adiante “o que nós verificámos é que há uma série de jovens que pretende fazer manifestações sem que para tal estejam devidamente autorizados, sem que se enquadrem na letra e no espírito da lei sobre direito de reunião e de manifestações…”
17 – O porta-voz da polícia Nacional confirma ainda durante as suas declarações de 13 de Setembro de 2013: “é assim que nesta altura temos dois jovens detidos, propagandas como estas que constam nestes escritos são susceptíveis de alterar a ordem e a segurança pública. Nós não podemos enquanto forças e serviços de segurança pública, permitir que cidadãos nacionais ou estrangeiros coloquem estes dizeres, insultem o mais alto magistrado da Nação, a sua ex.ª o sr. presidente da República, porque, nós temos que perceber que a nível do plano interno e no plano externo, quem representa a Nação é o presidente da República”
18 – Da análise de tais declarações e de tais trabalhos jornalísticos divulgados pela TPA e RNA, a OMUNGA considera que é inaplicável o artigo 4.º, ponto 1 da Lei do Direito de Reunião e de Manifestação já que tais “escritos” não enfocam nomes ou entidades;
19 – Por outro lado, os “escritos” transcrevem o título de um livro do jornalista Domingos da Cruz que precisamente foi inocentado pelo Tribunal já que este não encontrou argumentos acusatórios, passando esta decisão a ser a partir dessa altura, base de jurisprudência para casos posteriores;
20 – Considera assim que a utilização ou reprodução de frases, textos, ideias que em tribunal já foram considerados, julgados e inocentados, não podem ser agora utilizados como argumento acusatório pela polícia nacional;
21 – Considera ainda que a decisão pela apreensão do referido material não deve ser pretexto para a decisão de impedimento de realização do direito à manifestação de acordo à sua própria definição de conceito de manifestação, considerado em espírito e letra na referida lei do direito de reunião e de manifestação;
22 – Estando os organizadores devidamente identificados através da carta que dirigiram ao governo provincial de Luanda, enquanto o ente jurídico abalizado pela lei para poder definir existência de irregularidades, deveria o comando provincial da polícia nacional de Luanda, endereçar aos mesmos as suas interpretações em vez de utilizar os órgãos de comunicação social, ainda por cima públicos;
23 – A RNA e a TPA não cumpriram com as suas responsabilidades, de informar com a ética, ao não terem dado qualquer possibilidade para que os organizadores das manifestações apresentassem os seus pontos de vista, conforme manda os princípios da imprensa;
24 – A RNA e a TPA não cumpriram com as suas responsabilidades ao não terem permitido aos dois jovens detidos ou aos seus dignos representantes, a possibilidade de apresentarem os seus necessários pronunciamentos.
Nesta conformidade, a OMUNGA informa:
I – Organização do Acto Público pelo Movimento Revolucionário
a) Considerar legal e legítima a realização do acto público previsto para 19 de Setembro de 2013, a partir das 15 horas, no Largo da Independência, em Luanda;
b) Exigir do Governo Provincial de Luanda e do Comando Geral da Polícia Nacional, a garantia da protecção quer dos organizadores, quer dos participantes ao referido acto público, impedindo e responsabilizando quaisquer tipos de provocações, ameaças, agressão, repressão, detenção ou rapto como aconteceu com os concidadãos Kassule e Kamulingue;
c) Considerar que a OMUNGA tem sido testemunha e vítima de constantes agressões e impedimentos de realização de manifestações em Angola, pelo que, e enquanto instituição de promoção e de protecção dos Direitos Humanos com o Estatuto de Observador da Comissão Africana dos Direitos do Homem e dos Povos, estará presente no aqui referenciado acto de 19 de Setembro, nessa condição, para fazer o acompanhamento e a cobertura através de observação e registo de imagem e som;
II – Declarações do porta-voz da polícia Nacional sobre manifestações
a)
Considerar
que a polícia Nacional não tem legitimidade legal para se referenciar a
“autorização” de manifestações já que a própria lei e o próprio Direito,
consagram a desnecessidade de autorização para o exercício de direitos;
b)
Considerar
as declarações do porta-voz da polícia Nacional como ameaçadoras e possíveis de
serem interpretadas como carregadas de intenções desse órgão de segurança de
intervir de forma repressiva contra os organizadores e participantes no já
demais referenciado acto público;
c)
A
polícia Nacional tem que apresentar os argumentos de que se apropriam para
declarar que determinada manifestação ou “escritos” possam pôr em causa a “segurança
e a ordem pública”;
III
– Comportamento da RNA e da TPA
a)
Considerar
o comportamento da RNA e da TPA como uma flagrante violação do direito à
informação por, um lado, não garantir o contraditório e, por outro lado,
juntando nas peças entrevistas com enfoque ao medo de uma ameaça de guerra,
induzindo os ouvintes a relacionarem os organizadores de manifestações de
contestação com intentores de uma possível guerra;
Pelo
descrito, a OMUNGA, sente-se obrigada a publicamente tomar o seguinte
posicionamento:
1
– A OMUNGA continuará a acompanhar todo o processo relacionado com a realização
do acto público organizado pelo denominado Movimento Revolucionário previsto
para as 15 horas de 19 de Setembro de 2013, no largo da Independência, em
Luanda:
2
– Nesta conformidade a OMUNGA submeterá um relatório à Comissão Africana dos
Direitos do Homem e dos povos sobre o referido processo;
3
– A OMUNGA responsabiliza o governo provincial de Luanda e o comando provincial
da polícia nacional de Luanda por toda e qualquer violência e/ou repressão
contra os organizadores, antes, durante e depois do referido acto que seja
claramente evidenciada enquanto violação do direito à manifestação;
4
– A OMUNGA apela ao Provedor de Justiça, ao Procurador-geral da República, ao
Presidente da Assembleia Nacional, ao Ministro da Administração do Território,
ao Ministro da Justiça e Direitos Humanos e ao Ministro do Interior,
responsabilidades para que tomem as medidas necessárias de prevenção para que,
quer o governo provincial de Luanda, quer o comando provincial de Luanda da
polícia Nacional intervenham conforme é exigido num Estado Democrático e de
Direito;
5
– A OMUNGA apela ao Conselho Nacional da Comunicação Social e ao Sindicato de Jornalistas
para que tomem todas as medidas legais e urgentes no sentido de permitir o
acesso dos organizadores do acto público de 19 de Setembro, bem como dos 2
jovens detidos ou de seus dignos representantes, em termos de direito de
resposta e em termos de direito dos cidadãos a uma informação imparcial, a
tempo igual e em igual horário que o concedido às declarações do porta-voz da
polícia Nacional a 13 de Setembro, incluindo a possibilidades de juntarem
entrevistas, caso pretendam, conforme as peças emitidas na altura pela RNA e
TPA.
José António
M. Patrocínio
Coordenador
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