22/04/2011

A VITÓRIA É CERTA (José Desencantado)

A vitória é certa!

Quando penso no momento que estamos a viver, parece que estou a ver um filme antigo numa televisão nova, num plasma de cinquenta polegadas, comprado na loja de um libanês, com imagem em alta definição e sistema de som digital. No filme, quem me conta a história é um velho, mas tudo parece mais nítido, como se a história já tivesse escrita dentro de mim.
O velho que me conta a história tem trinta e cinco anos de uma fome que sonhou um dia não mais sentir. Ele fala comigo numa voz chorada, mas pede para ter esperança. «A esperança não cai do céu, vem na coragem do teu coração», diz ele.
Nessa nova história, que o velho esfomeado me conta, um dos personagens já não é o mesmo. Na voz desse velho, o colono branco foi substituído por um partido. Nesse partido há mestiços, uns poucos brancos, mas a maioria é negra, diz num tom triste. «Negros como eu. Alguns são estrangeiros, mas não é esse o problema, mô neto, muitos até são inteligentes, mas só têm um interesse».
Nessa história que me conta o velho no meu plasma novo, já não há PIDE, a PIDE foi trocada pela Polícia Nacional. Pensei é mentira do velho, mas ele jura que não mente.
«Só mudou o nome, mô neto».
Levanta a camisa e mostra nas costas os sinais do porrete que lhe deu um polícia.
«Rapaz novo, mas estava cheio de raiva parece é cão doente. Me bateu e recebeu o carrinho com os sacos de fuba, quando estava a trabalhar nos Congolenses».
Mas não foi só ele.
«Até nas senhoras tavam bater, coitadas só querem viver. Uma lhe deram com porrete na cabeça da criança dela que tava nas costa. Criança a morrer, Polícia nem ajudó, só levou bacia com bombó. Nem já a PIDE, mô neto, nem já a PIDE…».
Na história que me conta o avô, o povo continua o mesmo. Continua com a fome que o colono deixou, continua sem a liberdade que um dia sonhou. «Mas, diz o velho com um sorriso, «o povo tá a ganhá corage. «Naquele tempo nós escrevíamo nas parede, lutávamo com catana, mas, agora, você, mô neto – me olha com orgulho e uma gota de lágrima – você luta com os computadori, escreve nos muro dos facibuk.
Achei graça aos facibuk e dei uma gargalhada.
«O velho está a ficar maluco», Pensei.
«Num ri! tó falá verdade! Essa história nu é nova. Só velho mas num só burro. Tamém num tão falar você e os tós amigos são bandidos? Tamém num tão falar você e os tós amigos só querem fazé guerra? Tamém num tão querer vos prender? Num querem vos tirá dos emprego? Num tão falá que a culpa nué deles e a vida afinal tá mbora boa? Que pobreza está a acabar? Num tão falá que vocês tão frustrado e tão vos mandá fazé confusão no estrangero?
Fiz sim com a cabeça, meio envergonhado.
«Então! Num tó te falar? Só velho mas num só burro. Naquele tempo os colono tamém nos falaram assim. Até os nosso irmão nus falaram mal! Quando pensamo lutar, pessoas memo que tavam sofrer como nós, falavam tamo maluco. Qui melhor era esperar, que sofrimento um dia ia acabar, que nunca que iamo ganhar os branco. Uns tinham só medo. Mas medo num mata fome do colono. Agostinho Neto faló a vitória é certa, por isso avançamo. Só tinhamo coragem e umas catana, mas assim memo avançamo. Primero eramo só doze, fizemo confusão que saiu nos jornal. Depois ficamo vinte, depois chegamo a trezendo, depois só vimo já, era o povo todo que tava lutar e ninguém mais que conseguiu nos parar. Continua, mô neto, a vitória é certa!
By José Desencantado

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