16/11/2008

FILOMENO PÕE O DEDO NA(S) FERIDA(S)

"A questão fundamental do contexto tem a ver com o facto de estarmos num país de democracia multipartidária mas que ao longo destes 16 anos, por todo um conjunto de contigências desde a questão da direcção da condução da guerra por um partido político ( a direcção da guerra no sentido do combate oficial), até ao facto de nós termos tido uma assembleia com maioria também do partido da situação, isto faz com que o jogo parlamentar acabasse por ser dominado por esse partido político e as leis naturalmente não deixassem de reflectir a vontade desse partido político. Nós não conseguimos ter uma transição que pudesse corresponder à consensualidade e que pudesse corresponder a todo um conjunto de agentes políticos e sociais, nos quais a grande maioria da nossa população se revisse e que portanto poderiam eventualmente chegar a acordos e regras equilibradas de gerir o momento de transição para a democracia. Vivemos efectivamente um período de partido único e que tinhamos naturalmente muitos desejos, mas que do ponto de vista da dinâmica social, foi um período de concentração de poderes, um período de ausência de democracia e portanto um período em que apenas tinha voz de intervenção política (voz no espaço público), uma certa tendência política e isto passou-se (digamos) quer na Angola oficial como se passou também na Angola de guerrilha, em que havia predomínio de quem tinha liderança política. Nós tivemos extremas dificuldades de fazer uma transição consensual. O que temos reparado em toda a África, é que quem conduz as transições, conduz essas transições em seu benefício próprio. Dificilmente conseguem ter regras que sirvam todos os agentes. O exercício que nós podíamos tentar fazer era o exercício de que, eu sou poder mas vou pensar que se eu fosse oposição, esta regra era uma regra adequada também à minha convivência e à minha integração no sistma político? Este exercício é difícil de se fazer!"

Foi assim que Filomeno Vieira Lopes iniciou o QUINTAS DE DEBATE de 13 de Novembro de 2008. Argumentando sempre a sua apresentação com exemplos, continuou comparando com o caso da África do Sul que (ao contrário de Angola) integrou no processo de democratização "vontades diversas, vontades inclusivé de partidos políticos minoritários, de personalidades, porque quando toca à discussão", segundo o preletor, "aqueles que não são dominantes (muitas vezes) produzem mais ideias de equilibrio porque não estão interessados no poder, não estão interessados na força e dão grandes contributos para a sociedade. O nosso processo aqui foi um processo bastante bipolarizado, um processo de duas forças com grande poder e isto dificultou o equilibrio que seria desejável para o país. É um pouco este contexto que nos faz concluir que (nós) não tinhamos criadas as condições do espírito democrático. Aquele espírito que faz com que eu jogue regras. Regras, independentemente da dimensão em que nos encontramos."

Falando já dos resultados das últimas eleições, disse que "mostram que houve uma esmagadora maioria do partido da oposição. Há pessoas que estão (se encontram) surpresas com este resultado. Não percebemos (por todo o país) uma exultação destes resultados. As pessoas olham-se umas para as outras perguntando: como é que produzimos esta situação de tanto desequilíbrio?! Quando (inclusivé) muita gente (pessoas com muita intervenção política e cívica) aclamava muito por certo equilíbrio!? Todos nós percebemos que não temos o hábito da discussão. Não temos o hábito da partilha quer das ideias, quer do pensamento, quer (inclusivamente) daquilo que é material. A falta de sentimento de partilha traduz-se num défice democrático extremamente elevado. Isto cria situações de: não quero perder porque, se perder vou perder tudo; quero ganhar, custe o que custar (foram expressões que muitas vezes existiram em debate político). Em democracia não pode existir a expressão custe o que custar. Não criámos em Angola as condições de cidadana, em que eu (se perder), continuo a ser cidadão. Se sou carpinteiro continuo a ser respeitado, se sou jurista também e os meus direitos de cidadania não vão ser afectados por ter apoiado uma candidatura que perdeu. Ainda não é o espírito reinante."

Segundo Filomeno, entrámos depois no período das justificativas, ou seja, "perante o resultado eleitoral o grande esforço que fazemos é de tentar explicar porque é que isto aconteceu assim?! Porque é que isto tinha que acontecer assim como se fosse uma fatalidade! Esteve tudo certo! Os 82% são mesmo 82%. Os outros têm 30 deputados, são mesmo 30 deputados. Isto reflecte o que é que a Nação quiz!"

O prelector não concorda com estas análises e avança: "este resultado não reflecte de todo em todo a situação política nacional e a relação de forças que existe no país. Vimos que no contexto há um domínio absoluto das instituições por parte do partido da situação. Vimos que no contexto não conseguimos criar regras objectivas de cidadania e vimos que a transição não fugiu muito das outras transições relacionadas com os processos políticos africanos (processos de transição africanos). Podemos fazer uma verificação e em quase todos eles, quem conduziu a transição, ganhou necessariamente."

"Durante este processo eleitoral houve todo um conjunto de violações às próprias leis eleitorais", adiantou o prelector, passando do contexto e entrando já nas fases do processo (registo, pré campanha, apresentação dos processos de candidtura, apresentaçãos do processo de legalização dos próprios partidos políticos). "Constatamos que houve todo um conjunto de violações da lei. Por outro lado também houve um debate político em torno de várias questões. A questão mais pertinente tem a ver com o artigo 62 e que os partidos já legalizados foram forçados a apresentarem 15000 assinaturas. Isto é um grande esforço. E mais do que conseguir as 15000 assinaturas (porque as pessoas até corresponderam), o que se constata é uma grande perda de tempo em montar processos burocráticos, em ir-se atrás das pessoas para assinarem um documento e os partidos políticos, em vez de pensarem em soluções para o país, em estratégias eleitorais, acabaram perdendo muito tempo nisso."

Filomeno minimizou, mesmo assim, o facto de terem que recolher as assinaturas mas realçou os obstáculos que encontraram para o efeito: "a FpD teve muitos militantes que foram presos. As regras não tinham sido definidas com clareza e o boato prevaleceu. É importante vermos como o boato tem tanta força nesta nossa sociedade. O boato prevaleceu acima de qualquer outra regra. Chegou-se a dizer que não era permitido tirar fotocópias aos cartões eleitorais. Chegou-se inclusivé a dizer que se tirasse fotocópia aos cartões leitorais a banda magnética ficaria desmagnetizada. Muitas pessoas (militantes) quando estavam a tirar fotocópias, foram presas por causa disso, porque estavam a violar eventualmente um princípio. O que foi interessante é que quando o Tribunal Supremo (TS) definiu regras, e quando o TS define regras já estavamos (os partidos) em cima da altura de entregar os processos, o TS define precisamente que é necessário fazer-se a tal fotocópia do cartão de eleitor. O que é curioso, é que eu próprio (como equipa da FpD), tivemos a preocupação de tentar resolver este problema antecipadamente com o presidente da Comissão Nacional Eleitoral (CNE) e ele disse-nos que isto era irrelevante. Que bastavamos ter o apontameto do número do grupo e do número de eleitor para que fosse aceite. Vejam a grande confusão. Um dos problemas fundamentais de todo este processo eleitoral foi o de as regras não terem sido definidas atempadamente, porque as leis têm lacunas, as leis têm todo um conjunto de sombras ou de clareiras e os órgãos reitores do processo devem definir regras e essas regras devem ser definidas com bastante antecedência para minimizar o esforço. Nós fomos por uma direcção quando na realidade poderíamos ter ido por outra direcção." Filomeno garante que estas coisas não acontecem por acaso e diz que "em política não há assim tanta ingenuidade como muitas vezes nós pensamos."

Vieira Lopes garante mesmo que em todo o processo foram verificadas problemas extremamente graves que dificultavam a actuação dos partidos políticos da oposição (porque os que definiam as regras sabiam o que queriam). "A pré campanha (por exemplo) não tinha sido definida e quando um partido inicia a pré campanha, os outros partidos nem sequer estão em condições ainda de concorrerem porque não estão sequer ainda legalizados para este concurso. A pré campanha começa quando não se sabe sequer quais os partidos políticos que vão a peleito. Isto é o arrancar numa posição e os outros ainda estão todos parados a lutar com o Tribunal Constitucional (TC) para verem se passam ou se não passam."

Na opinião do analista, os problemas não ficaram por aí. "Perto do acto eleitoral, as regras também foram alteradas. Uma regra que existia era votar ali onde as pessoas estão registadas. Deixem-me chamar à atenção para uma coisa que a opinião pública não se apercebe: Não é votar aonde se registou, é votar onde a pessoa disse que tem a sua morada. Isso também criou um problema na entrega das assinaturas. Sabem que nós tinhamos que apresentar as assinaturas por províncias e nós pensavamos que província era ali onde a pessoa se registou. O TC considerou que a província era precisamente o local onde a pessoa afirmou que morava. A moradia da pessoa. O local mais próximo para a pessoa poder efectivamente votar. Isto é tudo uma confusão de regras. É falta de clareza de tal maneira que a gente contabiliza 200 assinaturas de Malange mas o TC diz que são apenas 100 porque as outras não são consideradas e temos que ir procurar novamente as assinaturas tomando em conta o local declarado da residência."

Filomeno V. Lopes acrescenta mais: " às portas das eleições, dois dias antes, quando todos nós estavamos satisfeitos com o grande sistema electrónico que foi criado na altura do registo, todos temos confiança que existiam os PDAs (uma espécie de telemóvel, acomulador de dados capaz de dizer onde é que a pessoa deve efectivamente fazer o seu voto e confirmar a sua posição de registo), no acto eleitoral tudo isto desapareceu. No acto eleitoral nem sequer cadernos eleitorais existiam. Uma das grandes diferenças que nós (a oposição) apostavamos e confiavamos era que nestas eleições (comparando com as de 92), existissem os cadernos eleitorais. Os cadernos eleitorais poderiam permitir a verificação se as contas estavam ou não estavam abslutamente bem feitas. Saber quem votou e se quem votou corresponde a uma pessoa regitada, onde votou e como é que votou. O caderno eleitoral permite estabelecer um controlo de todo esse conjunto de situações. A partir do momento que não há cadernos eleitorais, o processo deixou de ser verificável. Podia-se gritar muito que não se chegaria a conclusão nenhuma e tudo ficou muito confuso."


Já para o acto eleitoral, Vieira Lopes aponta uma série de problemas, dizendo que "aconteceu de tudo um pouco. Das pessoas que não tinham registo e votaram (há evidências disto), pessoas que votaram mais de uma vez, assembleias de voto fantasmas, assembleias de voto que não corresponderam efectivamente à votação concreta. Há locais em que se descrevem como sendo 3, 4 assembleias de voto teóricas. Em Luanda foi um verdadeiro pandemónio em termos de votação. Só votei às 15H00 e votei sem caderno eleitoral porque o sítio em que eu tinha que votar só abriu às 15H00 e debaixo duma grande confusão. Sem condições de privacidade para as pessoas poderem votar. Não sei como é que se conseguiram inventar uns sítios de votação verdadeiramente descartáveis com tanto dinheiro que foi empregue neste processo eleitoral. É evidente que estas coisas não são ingénuas e quando chegamos a pequenas contas, pequenas contabilidades, deparamos com coisas que nos surpreendem. Por exemplo para o caso do Kwanza Norte nós notamos que o número exacto de pessoas registadas corresponde ao número exacto de pessoas que votaram. Isto é uma grande coincidência. Isto mostra uma grande elaboração de dados, um pouco fora daquilo que é a vida normal, a vida natural. Decerto que houve pessoas que morreram desde a altura do registo, pessoas com possibilidade de mobilidade, e portanto é extremamente difícil imaginar o movimento compensatório dos que saiem e dos que entram, de forma a dar zero."

As contrariedades dos dados foram apresentadas pelo prelector ao dizer que " foram declarados (pela CNE) 9.439.714 boletins recebidos nas várias províncias e nas várias mesas e 2.190.662 como boletins não utilizados. Isto é um pouco incrível porque o que houve maioritariamente, foram assembleias em que os boletins acabaram muito cedo. Houve pessoas, muita gente que ficou sem votar nestas eleições. Muita gente mesmo, em várias províncias. Depois temos os boletins inutilizados que são 61.153. Se retiramos os boletins inutilizados e os boletins não utilizados dos boletins recebidos ficamos com 7.187.899. Consideramos que esses são os boletins contáveis e que devem corresponder com o número de votantes. Mas o que é que notamos (de acordo ainda à CNE), é que o número de votantes foi de 7.213.281. Não são dados inventados por nós, o que mostra que há uma contabilidade esquisita já que o dado tinha que coincidir. Obviamente que em algumas províncias houve diferenças a menos, noutras houve diferenças a mais e isto pressupõe no mínimo um aparente descontrolo. Um facto que me chamou muito à atenção foi o rigor com que o povo angolano vota. A proporcionalidade com que o povo angolano vota nas assembleias de voto. Desde que a contagem provisória começou, desde a contagem um até à décima contagem que as percentagens praticamente não variaram: 81,6% permaneceu, 10,2 - 10,5 permaneceu para a UNITA e para os outros partidos de igual forma. Não nos parece tão obvio que numa contagem de votos haja tanta proporcionalidade. Que as pessoas votem em todos os sítios nas mesmas proporções. Tudo isto chama à atenção para uma operação que esteve presente em todas as fases do processo, incluindo na fase do escrutínio em que os partidos políticos não tiveram acesso. Os partidos foram postos numa sala (pelo menos o nosso madatério) em que havia um ecrán e não tiveram acesso às actas que iam chegando para poder confirmar e poder também ver e acompanhar. Foi um processo muito pouco partilhado."

Vieira Lopes salienta que "as condições objectivas do contexto eram más, e portanto já era previsível que as coisas não corressem bem. O FpD (e também outros partidos) não tinha ilusões de que isto poderia ser um grande processo. A nossa grande aposta é que é preciso começar estes processos e havia uma renitência muio grande por parte do partido da situação de convocar as eleições, sobretudo da parte do Sr. Presidente da República. Afirmamos que é preferível fazer eleições com irregularidades com insuficiências, etc. do que não ter eleições. Os cidadãos têm que ser consultados. As eleições são mais do que o momento dos partidos políticos, o momento dos próprios cidadãos. Cidadãos que têm a soberania constitucionalmente atribuída, acabam por legitimar os mandatos neste modelo de democracia representantiva. Uma das grandes deficiências deste processo é que o cidadão eventualmente não terá visto isto assim, deverá ter visto que isto era o momento dos partidos políticos, não o seu próprio momento. Ele próprio não tomou grandes salvaguardas para defender o processo democrático e para ver que só com um processo democrático é que ele é soberano. Não há um outro processo em que ele consiga ser soberano, pelo menos nos modelos actuais de gestão política."

"Se nós sabemos que a situação objectiva era má. Se nós sabemos que durante o processo fomos verificando em todas as fases, todo um conjunto de debilidades e toda uma capacidade de controlo de todo este processo por parte do partido da situação, isto justifica a derrota da oposição? Isto significa que tudo está justificado? Que a oposição não tem responsabilidades neste processo? Nós pensamos que não! Compete à oposição ter também capacidade para anular todas as condutas anti-democráticas. Faz parte do seu papel minimizar este tipo de situações. Se estamos num contexto de domínio absoluto de todas as instituições (banco, comunicação social, etc.) por parte de um partido, o que seria lógico é que a oposição tivesse processos de unidade para dar um pouco a imagem de força, capaz de contrariar quem tem assim tanto poder. O que nós reparámos é ue a oposição ao longo deste processo, não foi capaz de criar minimamente estes processos de unidade. Não significa que não houve algum esforço por parte de aguns partidos. Também quero aqui dizer que todos nós já nos apercebemos que oposição não significa um partido que não está no poder. Há muitos partidos que estão na oposição mas isto não significa que sejam partidos da oposição. Também oposição não se restringe aos partidos políticos. Se eu sou democrata, se eu sou um cidadão democrata, posso não estar num partido político, mas se sou adverso a ditaduras, naturalmente que faço oposição. Da mesma maneira que eu para ser nacionalista não precisava de estar num movimento nacionalista! Comcerteza que se eu estou organizado com certa intensionalidade, claro que posso potenciar esta minha acção. Mas todos aqueles que mesmo individualmente fizeram um trabalho anti-colonial, naturalmenteque foram nacionalistas. Movimento de oposição é todo o movimento que se opõe a um certo status quo com o qual não concorda. Uma das questões que emergiu deste processo era eliminar todos os elementos ditatoriais que ainda vinham do passado monopartidário, para irmos para uma sitação mais democrática. Neste sentido temos que entender que há todo um conjunto de forças sociais interessadas que não restringem meramente aos partidos políticos."

"Do nosso ponto de vista os partidos políticos tiveram um défice de oposição. Esse défice é anterior ao próprio pleito eleitoral. Foi esse défice que permitiu que aquele contexto permanecesse. Isto porque (na opinião da FpD) uma boa parte dos partidos políticos beneficiou (ao longo destes 16 anos) mais questões relacionadas com o processo de partilha de poder do que propriamente encontrar modelos de trnasformação social em que a democracia fosse algo absolutamente indispensável e fosse uma bandeira absoluta de mudança. Isto prejudicou todo este processo eleitoral. Na essência, os posicionamentos da oposição não conseguiram ser posicionamentos de unidade com actividade activa no sentido do estado de direito. Temos muita oposição que prefere também estar à margem de todo um conjunto de leis positivas porque querem entrar no esquema da partilha do poder."

"Em particular, especificamente em relação à comunicação social de serviço público, a oposição nunca foi capaz de vencer os obstáculos que esta comunicação social criou. Para isso era preciso, sobretudo por parte da oposição parlamentar actos extremamente corajosos, mas que são actos democráticos. O boicote é um acto democrático! Ninguém consegue perceber como é que um país relativamente fresco no sentido democrático, um país em que a televisão consegue transmitir jogos em directo que se passam no estrangeiro, concursos de miss que se passam no fim do mundo, esta mesma televisão não consiga passar debates em directo sobre o que se passa na Assembleia Nacional, quando estamos a discutir assuntos cruciais do nosso país, como o orçamento geral do estado e outras matérias de interesse nacional. A oposição perdeu esta batalha!"

Mais adiante, e ainda debroçando-se sobre a comunicação social declarou que "durante o período eleitoral não foi possível rever a lei do ireito do tempo de antena, isto porquê?! O tempo de antena em países democráticos não se restringe ao pleito eleitoral. Também não se restringe aos partidos políticos. Uma associação comoo OMUNGA pode por interesse público ter direito ao tempo de antena ode falará de forma independente. Onde falará de forma autónoma! Onde não esta sugeito a uma pergunta de um jornalista porque isto condiciona. Não conseguimos fazer com que houvesse visibilidade dos partidos políticos na comunicação social. Perdemos a batalha pela ampliaçao do espaço público que ficou muito restridto ao partido no poder. Isto não tem a ver com o processo eleitoral. Tem a ver com toda a anterioridade do processo eleitoral. Houve um assalto claro às instituições, perfeitamente partidário, que houve a acomodação dos partidos políticos sobre isso. Houve partidos políticos que chegaram a afirmar (por exemplo) que para ter acesso a uma categoria na função pública precisa de ser militante do partido da situação, então os nossos militantes devem mesmo ter o cartão do partido da situação para poderem ascender aos cargos públicos. Isto significa uma capitulação face à democracia! Uma capitulação face à nossa cnstituição que é muito clara! Ninguém pode ver violados os seus direitos por questões políticas. Por pertencer a um partido político que não é o partido no poder. Mas houve lideranças políticas que afirmaram isto. Nessa altura os meios de comunicação sociais são muito hábeis (principalmente os públicos), são muito disponíveis para ampliar este tipo de posições. Isto é todo um descompromisso com a democracia. É todo o descompromisso com o se criar uma situação em que haja uma relação sã entre o estado e o cidadão. Em que o estado, independentemente do partido que dirige, pode ver no cidadão uma individualidade abstracta e possa ver o seu relacionamento independentemente da sua afiliação partidária."

"Houve pouco combate de fortalecer na sociedade civil (SC) as posições que têm a ver com a vulnerabilidade, a corrupção generalizada. A aceitação de um certo status quo, (por exemplo) se cometi uma infracção e o polícia vem pedir dinheiro, não sou capaz de dizer passe multa, eu pago a multa. Facilito as coisas e pago mesmo. Para ter acesso aos serviços públicos, entrámos duma certa forma de esquema que acaba por ser formas corruptoras da nossa própria consciência e acabam por nos desestimular a vontade de mudança. Os partidos políticos aí, como entidades políticas que fazem as várias sinteses da economia, do social, etc., têm naturalmente responsablidades em fazerem o combate a esse conjunto de situações para estimular o desejo da mudança no sentido da democracia."

"Que alternativas tinhamos nós para nos unirmos?" questionava Vieira Lopes referindo-se aos partidos da oposição. Apontou vários cenários, "desde criar uma frente de vários partidos que pudessemd efender a democracia, pelo menos o estado de direito, o estado de regras comuns para toda a gente e o respeito pelas leis começando pela constituição, até à unidade de se fazer o controlo do processo eleitoral, (os partidos não conseguiram esta unidade) até à unidade no sentido de termos um programa comum em torno do estado de direito que trouxesse confiança ao eleitorado e que dissesse: eu posso votar em qualquer um desses partidos da oposição porque eu sei que no limite eles vão defender para a sociedade, uma ídeia comum. Daria sempre noção de conjunto e noção de força. Começou-se a estabelecer na sociedade a ídeia de que o partido da sitação era muito forte, porque aparece muito na comunicação social, é o partido que faz comícios, é o partido que mostra ostentação, é o partido que todos os dias aparece na televisão a dar dinheiro, a dar tractores, a dar carros, obviamente que os outros partidos não podem, não têm esta capacidade. Todos nós sabemos que grande parte destes bens saiem do próprio erário público. Isto é a realidade e é sobre esta realidade que temos que operar. Os partidos não deram resposta a isso!"

Referindo-se ao partido no poder, disse mais adiante: "o facto de passar isso tudo na televisão não significa isso seja uma força real. É importante perceber que em política, o impressionismo é uma grande força. Se consigo impressionar que eu tenho tudo e os outros não têm nada e se eu contabilizar os votos a meu favor, as pessoas acreditam muito mais facilmente. É evidente este partido tinha mesmo que ganhar, era o único que movimentava massas, era o único que, era o único que, ... aparecia na televisão. Vimos como é que durante a campana, os partidos eram confinados apenas ao tempo de antena e praticamente o resto era propaganda (para o partido da situação)."

Falando já do financiamento dos partidos políticos, Filomeno realçou: "nós podemos dizer que os partidos políticos tiveram pouco tempo para fazer campanha. Isto não justifica! Os partidos têm que fazer leitura da situação política. Nós tivemos uma calendarização em que havia um artigo (por exemplo no que diz ao financiamento) que era um engodo, que dizia: os partidos políticos concorrentes têm acesso aos fundos três meses antes da campanha eleitoral, mas do ponto de vista do cumprimento da calendarização prática, os partidos só tiveram acesso (porque os partidos só ficaram legalizados) um mês antes do acto eleitoral. E toda a tramitação para se abrir uma conta bancária específica levou mais entre uma semana e 15 dias, então os partidos tiveram inheiro entre duas semanas a três semanas. Agora, qual é oc ontexto desta sociedade?! Ninguém consegue créditos (por causa do domínio absoluto). Tudo é pronto pagamento! Ninguém consegue comprar camisolas (um caso banal) a crédito. Durante esse tempo todo só conseguimos encontrar um fornecedor que nos deu crédito. Um fornecedor que vende máquinas fotocopiadoras. De resto é tudo pronto pagamento! Embora sejamos um país que tem um sistema bancário extremamente forte com grandes níveis de liquidez, podia-se pressupor que este sistema bancário poderia dar crédito ao comerciante e este comerciante pode dar crédito ao cliente. Não ser eu a ir directamente ao banco buscar crédito bancário para fazer uma compra no sistema comercial. A culpa é do sistema? A culpa é dos partidos políticos. Tudo isto tem que ser analisado e ter força para inverter esta situação e ter capacidade para mobilzar a SC e verificar que isto é um problema seu, não é (só) um problema dos partidos políticos."

Os direitos e as liberdades também foram analisadas pelo prelector: "O problemas das liberdades das pessoas organizadas é um problema de toda a sociedade. A polis é precisament isso. As pessoas organiadas e que têm interesses públicos e portanto todos os nossos interesses são visados. Cabe a responsabilidade (em primeiro lugar) aos partidos políticos de mobilizarem essas forças sociais entendam que isso é um problema seu e isso não foi feito. Fomos perdendo todo um conjunto de batalhas desde a marcação da data eleitoral, a calendarização equilibrada em que tiveram esses prazos muito apertados. Perdemos também a batalha da CNE. Aqu é uma batalha fundamental. Antes da batalha da CNE perdemos a batalha do registo (leioral). FOi o governo que fez o registo quando gostaríamos que fosse um CNE. Mas o próprio CNE acabou por ter uma composição em que nós tinhamos (com rigor) 3 pessoas da oposição (num total de 10 ou 12 pessoas). A lei também foi alterada (da composição da CNE) nos últimos tempos. Vocês sabem que os juízes poderiam fazer parte da CNE. Foram os juízes que lideram toda a fase do registo em todas as províncias. Depois alterou-se a lei e em vez de ser o colecivo de juízes a indigitar o juíz passou a ser o governador. Nós tinhamos contestado isto de início, mas deixou-se arrastar o proesso. Na altura da conveniência do partido da situação, fez-se esta alteração! Vejam que o juíz presidente não foi alterado. O fundamento que levava a alterar os outros juízes é o mesmo que poderia levar a alterar o juíz presidente. Mas o juíz presidente não foi alterado! Manteve-se! Também não fomos capazes de empreender uma luta neste sentido para clarificar isto."

Perante o quadro de incapaidade da oposição ter empreendido combates sérios para contrariar o quadro, Filomeno adiantou: "Houve toda esta falta de combate que podemos dizer que repousa em duas grandes ídeias. A primeira ídeia é que estamos relativamente à vontade porque existe um grande nível de descontentamento. A segunda ídeia é que não há eleições perfeitas , estamos numa situação em que nunca vamos ter eleições perfeitas e portanto não vamos fazer muito finca-pé. Obviamente que a oposição também temia (e temeu muito) a comunicação social do estado que é bastante agressiva. Quando a oposição colocava uma questão de suspeita tinhamos uma bateria de posições impressionates da comunicação social em que começavam logo a dizer - já estão a dizer que vai haver fraude, querem mesmo irritar as pessoas, fazer aqui tumultos e criar situações desagradáveis. É verdade que todos vivemos com o estigma de que este país viveu mais de 40 anos de guerra e que é preciso preservar a paz e dar uma oportunidade muito clara ao povo angiolano para exercitar a democracia. É esta a ídeia que faz os partidos políticos, apesar de ficarem muito defraudados com este processo eleitoral, acabassem todos por não criar dificuldades e de consentir que este processo prosseguisse. Não é a leitura correcta. Não há condições para se fazer um debate muito sério em torno destas matérias. Todas as questoes que colocámos à CNE sobre a contradição dos números, problemas que existiam, a necessidade de termos consenso, nunca obtiveram qualquer resposta. Se os partidos entrassem numa de contestação dos resultados, seriam muito faclmente catalogados como agentes de perturbação e poder-se-ia criar todo um conjuto de factos extremamente desagradáveis. Haja em vista que todas as forças policiais e para-policiais estiveram de prevenção praticamente um mês antes das eleições, apesar de que não havia quase indícios nenhuns de qualquer acto de violência. Ponderadas todas essas questões, os partidos políticos (no nosso entendimento) tomararam a posição que tomaram, porque com isso abrimos este espaço de debate e de diálogo. Podemos conversar calmamente. Não vamos remover quem lá está, mas temos a lefitimidade da conversa. Isto é importante para aperfeiçoarmos o nosso sistema e prevenir o mais possível os futuros pleitos eleitorais. E é preciso prevenir! É preciso prevenir porque chegámos à conclusão que a democracia e importante."

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