29/05/2009

DEMOCRACIA, CIDADANIA E ELEIÇÕES: O que é necessário para que eleições signifiquem Democracia? O papel da Sociedade Civil no equilíbrio político

Tina Abreu foi a primeira mulher a orientar um QUINTAS DE DEBATE. Fê-lo a 28 de Maio de 2009, sobre o tema Democracia, Cidadania e Eleições em Angola. O que é necessário para que as eleições signifiquem Democracia? O papel da Sociedade Civil no equilíbrio político em Angola.

A seguir transcrevemos a sua apresentação na íntegra.

I - Introdução ao Debate
Para iniciar este Debate, precisamos antes de mais de nos situarmos no que se refere aos conceitos incluídos no tema proposto para o Debate, nomeadamente: Democracia, Cidadania, Eleições e Sociedade Civil.

Por outro lado, esse título também evidencia a vontade de se debater o processo de construção da democracia enquanto sistema de governação assente na promoção da cidadania e na realização de eleições, destacando o papel da sociedade civil para o alcance desse objectivo. Implicitamente, o título já aponta para uma forma de democracia que agrega às eleições (democracia formal, eleitoral), a prática diária da democracia através da promoção da cidadania.
Antes de apresentarmos a nossa contribuição para esta discussão, vamos passar em revista a essência dos conceitos mobilizados, começando exactamente por democracia.

1.
Democracia
refere-se à forma como o Estado exerce o seu poder soberano. Mais especificamente, refere-se a quem exercerá o poder de Estado, já que o Estado propriamente dito é uma ficção jurídica, isto é, não possui vontade própria e depende de pessoas para funcionar. Na sua origem do grego, "democracia" quer dizer "governo do povo". Nas sociedades modernas, contudo, não é possível o povo governar propriamente, exercer a democracia directa; por isso, os actos do governo são exercidos por membros desse povo "politicamente constituídos", os escolhidos para cargos públicos através de eleições. No Estado democrático, as funções típicas e indelegáveis do Estado são exercidas por indivíduos eleitos pelo povo de acordo com as regras pré-estabelecidas que regem o pleito eleitoral.

No Estado Democrático de Direito, apenas o direito positivo - o que foi codificado e aprovado pelos órgãos estatais competentes, como o Poder Legislativo -, poderá limitar a acção do Estado, e somente ele poderá ser invocado nos tribunais para garantir o chamado "império da lei". Nesse contexto, destaca-se o papel da Constituição, porque nela se inscrevem os limites e as regras para o exercício do poder estatal (nomeadamente as chamadas "garantias fundamentais"), e, a partir dela, e sempre tendo-a como referência, constrói-se o restante "ordenamento jurídico", o conjunto de leis que regem uma sociedade. O Estado Democrático de Direito não pode prescindir da existência de uma Constituição.

É com o nascimento do Estado de Direito que o ponto de vista do príncipe se transforma em ponto de vista do cidadão. “No Estado de Direito, o indivíduo tem não só direitos privados, mas também direitos públicos. Por isso o Estado de Direito é o Estado de cidadãos”.

A democratização ou processo de construção da democracia (sistema de governo no qual o poder é investido no povo e exercido através de representantes escolhidos em eleições livres e justas, que também inclui e protege direitos de minorias e respeita visões e opiniões plurais), pressupõe a definição do tipo de democracia que se irá construir e procurar desenvolver (eleitoral, consultiva, participativa, etc.) numa dada sociedade, e a capacitação dos seus cidadãos para participação no mesmo: tomada de consciência e exercício dos direitos, deveres e responsabilidades.

Um processo que viabiliza a governação da sociedade de forma democrática é a descentralização, que consiste na transferência de autoridade e responsabilidade do governo central para outros níveis de governação, provincial, municipal e comunal. E ele é fundamental porque permite concretizar um dos princípios básicos da boa governação e da democracia: a inclusão progressiva de todos os grupos sociais, temas e realidades regionais na agenda política nacional viabilizando a participação. Quando se verifica uma real transferência legal de poderes e responsabilidades do Estado central para os governos locais ou sub-nacionais eleitos, estes passam a exercer poderes que integram a sua competência própria, apesar de sujeitos à tutela administrativa mais ou menos acentuada do poder central.

2.
Cidadania
é a condição da pessoa que, como membro de um Estado, se acha no gozo dos direitos que lhe permitem participar da vida política. A cidadania é, portanto, o conjunto dos direitos e dos deveres de que goza um indivíduo que lhe permitem intervir na direcção dos assuntos públicos do Estado, participando de modo directo ou indirecto na formação do governo e na sua administração: ao votar (directo) ou ao concorrer a um cargo público (indirecto).

A nacionalidade é um pressuposto da cidadania: ser nacional de um Estado é condição primordial para o exercício dos direitos e o cumprimento dos deveres dentro do território desse Estado. Contudo, importa notar o seguinte: embora todo o cidadão seja nacional de um Estado, nem todo o nacional é cidadão, porque indivíduos destituídos dos direitos e desobrigados dos deveres (refugiados e exilados políticos, doentes mentais, pessoas destituídas dos direitos políticos por crimes contra a humanidade, o Estado e o bem público, por exemplo) podem ser nacionais de um Estado sem serem cidadãos.

Ao longo do tempo, diversas gerações de direitos foram incorporados à noção de cidadania:

Ø Os direitos de primeira geração - direitos civis e políticos.
- Século XVIII: os direitos civis correspondem aos direitos individuais à vida, segurança, liberdade, igualdade, propriedade, ir e vir, etc.. Estão na base da concepção liberal clássica;
- Século XIX: os direitos políticos dizem respeito à liberdade de associação, reunião e organização política e sindical, à participação política e eleitoral, ao sufrágio universal, etc. São os chamados direitos individuais exercidos coletivamente, e acabaram por se incorporar na tradição liberal.

Ø Os direitos de segunda geração - os direitos sociais.
Século XX: a partir das lutas dos movimentos operário e sindical, os direitos sociais tornam reais os direitos formais, representam a garantia de acesso aos meios de vida e bem-estar social, correspondendo aos direitos ao trabalho, saúde, educação, reforma, etc.
A relação entre direitos de cidadania e o Estado é recorrente na literatura devido à tensão interna entre os diversos direitos que compõem o conceito de cidadania, designadamente entre os relacionados com “liberdade” e os relacionados com “igualdade”. Enquanto a plena realização dos direitos de primeira geração - civis e políticos – sugerem como desejável um Estado mínimo, a concretização dos direitos de segunda geração - direitos sociais - demanda uma presença mais forte do Estado. É por isso importante notar que a tese neoliberal do Estado mínimo prevalecente na social-democracia dos anos 90, corresponde a estratégias diferenciadas dos diversos direitos da cidadania e respectivos atores sociais, e não a meras discussões quantitativas.

Ø Os direitos de terceira geração
- Segunda metade do século XX: referem-se aos direitos que têm como titular não o indivíduo mas grupos de indivíduos constituídos em “povo”, “nação”, “coletividades étnicas” ou a própria humanidade, como o direito à autodeterminação dos povos, ao desenvolvimento, à paz, a um meio ambiente saudável, etc.

Os “novos movimentos sociais” defendem como direitos de terceira geração os relativos a interesses difusos, como direito das mulheres, das crianças, do consumidor, das minorias étnicas, dos jovens, dos anciãos, etc.

Recentemente, começam a ganhar espaço nas discussões os chamados “direitos de quarta geração” relativos à bioética, com vista a regular a criação pela engenharia genética de novas formas de vida em laboratório e, assim, impedir a destruição da vida.

Alguns factores limitam o exercício de uma cidadania ampla e activa em Angola; entre esses factores, os mais importantes resultam:

Ø de uma democracia frágil e limitada por uma visão formalista e redutora, que não garante igualdade de condições e de oportunidades para o exercício da cidadania;
Ø da ausência de uma cultura política por parte dos actores sociais, capaz de interpelar o Estado e romper com relações clientelistas e corporativas, e o autoritarismo patrimonialista, que limitam a expansão do processo democrático;
Ø do acesso desigual aos serviços públicos, como educação, saúde, saneamento, justiça, entre outros, discriminando largas porções da sociedade;
Ø de um distanciamento das instituições do Estado em relação aos cidadãos, ignorando a existência de amplos segmentos sem voz nem visibilidade, agravada pela incapacidade crónica de garantir os direitos básicos;
Ø da presença de sentimentos de impotência política, desamparo social, resignação e/ou conformismo, reduzindo ainda mais as probabilidades de diálogo social.

Estes factores influenciam o fraco empenho, por parte da sociedade, em aumentar os níveis de participação no processo de tomada de decisão e de gestão pública. Para além do receio de retaliações por expressar opiniões sobre questões políticas devido à prevalência da ideia de que a política é assunto reservado ao sistema político, alimentada pela pouca abertura do espaço público que inibe o desenvolvimento de uma cultura de debate e a valorização da própria opinião e da dos outros, os custos da acção colectiva parecem pesar na opção pela não participação. Numa sociedade que vive no curto prazo, no imediatismo, na busca de soluções para os problemas de sobrevivência no dia-a-dia, a disponibilidade de tempo para participar é um luxo de que a maioria não dispõe. Por outro lado, sentimentos de inevitabilidade, de resignação, de não valer a pena, também estão na origem desta escolha, entendida como a mais segura.

3.
Eleição
é o processo pelo qual um grupo designa um de seus integrantes para ocupar um cargo por meio de votação. Na Democracia representativa, é o processo que consiste na escolha de determinados indivíduos para exercerem o poder soberano, concedido pelo povo através do voto, devendo estes, assim, exercerem o papel de representantes da nação. A eleição pode processar-se com o voto de toda a comunidade ou de apenas uma parcela dessa comunidade, os chamados eleitores.

Eleição não é luta do bem com o mal. É comparação.

A construção de uma sociedade democrática significa, em primeiro lugar, o fim da miséria, a redução da desigualdade social, a promoção da cidadania. Precisamos promover esse salto qualitativo para melhorar as condições sociais com uma temperatura baixa de conflitos, para podermos afirmar que a questão social está sendo bem conduzida, bem orientada, obtendo bons resultados.Uma eleição não é uma guerra. Amanhã e sempre, teremos de conviver com todos os candidatos que tenham merecido a confiança das suas bases eleitorais nos processos de selecção de candidatos. Por isso, é preciso eliminar os discursos raivosos, o denuncismo vazio, a crítica vazia de novas propostas, da interposição de alternativas viáveis e mais adequadas, a ameaça ao voto universal. Democracia significa respeitar o discurso do outro. Nas eleições, as pessoas exaltam-se frequentemente, mas é desonesto deformar o que o outro disse. Isso torna a política mesquinha; em lugar de uma arena de adversários, pessoas que pensam e sentem diferente, mas que se identificam com um sentimento maior, o da angolanidade, temos uma luta entre inimigos. Esse clima de desrespeito e desconsideração mútuos, de ausência de diálogos, não ajuda em absoluto a alcançarmos o que mais precisamos, nós angolanos, como seja construir alianças, trabalhar em conjunto, buscar convergências e formas de entendimento, e aprender a lidar com as divergências.

A sociedade é maior que a política, e Angola é maior do que os partidos. A pequena ambição não pode por em causa as nossas oportunidades de construir um futuro melhor para todos nós e principalmente para as novas gerações. Mas para isso, precisamos combater a pobreza, eliminar a desigualdade social, melhorar a educação, a saúde e outras condições básicas, integrar os excluídos. E este não deve ser entendido como um projecto de governo, mas sim como um projecto de sociedade, que necessita de debate, de negociação e de inclusão da opinião e da participação de todos os angolanos. Os interesses maiores da nação devem sobrepor-se às agendas dos partidos. E esses interesses maiores são a reconciliação nacional e a reconstrução económica e social, depois de tantas décadas de guerra civil.

O apelo à civilidade surge, então, relacionado com o esforço de compatibilizar os conflitos de interesses presentes na sociedade de uma forma equitativa e durável.

4.
O termo civilidade traduz uma tentativa de explicar o paradoxo da construção da cidadania numa sociedade dominada por valores individuais. Como ponte entre sociedade civil e Estado, foi empregado por Shills num sentido ao mesmo tempo individualista, paroquial e holista para representar a atitude individual de preocupação com o bem público, transmitindo a ideia de espírito público que se perdeu na sociedade de mercado. Traduz a conduta de uma pessoa cuja auto-consciência individual é, ainda que parcialmente, dominada por sua auto-consciência colectiva, cujas referências são a sociedade como um todo e as instituições da sociedade civil.

Mais recentemente, finais do século XX, com o processo de globalização, as grandes questões económicas, sociais, ecológicas e políticas deixaram de ser apenas nacionais, tornaram-se transnacionais. Os problemas que afectam a humanidade e o planeta atravessam fronteiras, como as relacionadas com a produção, o comércio, o capital financeiro, as migrações, a pobreza e a desigualdade crescentes, os danos ambientais, o desemprego, as tecnologias de informação e comunicação, entre outras, deixaram de ser apenas nacionais, tornaram-se transnacionais.

Neste contexto nasce o conceito de “cidadão do mundo”, a ideia de uma cidadania planetária que vem sendo paulatinamente construída pela sociedade civil supranacional em contraposição aos interesses políticos e económicos dos Estados e da economia.

5.
Num sentido amplo do entendimento do conceito, a sociedade civil corresponde à auto-organização da sociedade fora dos campos estritos do poder do Estado e dos interesses do mercado. É o conjunto de organizações e redes institucionais independentes do aparelho de Estado: interagem com o poder público, mas são autónomas. Para além das redes de organizações formais, a sociedade civil também inclui grupos informais de cidadãos empenhados em actividades de alcance público.

Os problemas socioeconómicos, culturais, ambientais, e relacionados com as políticas públicas e as lutas pelo amplo e livre exercício dos direitos humanos, sociais, políticos e cívicos, constituem o objecto das suas preocupações. Estudos de caso revelam que a actividade da sociedade civil tem impactos muito positivos na qualidade de governação.

Trata-se de um espaço de intervenção de origem privada e com finalidade pública e de bem comum, sendo portanto simultaneamente voluntário e público, unindo a virtude própria do sector privado – a liberdade – à virtude do sector público, o sentido do bem comum, pelas interfaces que cria, podendo mediar entre Estado e a iniciativa privada, oferecendo um espaço de acção aos cidadãos que é simultaneamente público e privado.

É um amplo espaço de relações sociais não reguladas pelo Estado, buscando a emancipação do poder político, tendo como objectivo a criação de instâncias de modificação / transformação das relações de dominação, sem pretender constituir-se como contra-poder ou antítese do estado, reconhecendo, pelo contrário, a distinção e complementaridade de ambas as esferas – e a legitimidade de uma e de outra -, e o papel do Estado em promover a emergência da sociedade civil numa sociedade com pouca experiência de vida política independente, através da mediação de grupos de interesse e da protecção contra a dominação das elites.

É também percebida como o espaço de formação democrática da opinião pública, enquanto expressão do consenso ou dissenso relativamente às instituições estatais, seja através de discussões em debates, mesas redondas, workshops, conferências, seminários e outras actividades colectivas, seja através de programas de opinião transmitidos pelos órgãos de comunicação social. Esta função parece particularmente valorizada pelos participantes na pesquisa de campo, dada a situação de transição que o país vive, de um regime totalitário (no qual a esfera pública foi ocupada pelo Estado e onde prevalecia a opinião oficial), para um regime pluralista.

É um processo dinâmico e, fundamentalmente, político de interacção entre várias organizações da sociedade e entre estas e o Estado, através do qual são forjadas, fortalecidas ou enfraquecidas as relações de poder, pela criação de oportunidades para diferentes grupos (particularmente aqueles em situações política ou socialmente desvantajosas) adquirirem a capacidade de influenciar os resultados políticos, e contribuindo para a emergência de modelos alternativos de desenvolvimento.

A sociedade civil tem papéis/funções a desempenhar no novo contexto da reconstrução nacional, referidos amiúde nos discursos oficiais em momentos críticos como Abril de 2002, na comemoração dos 30 anos da independência, etc., e presentes diariamente nos meios de comunicação pelos mais diversos tipos de actores nacionais e estrangeiros, que foram contemplados em instrumentos jurídicos, como a Lei Constitucional em vigor.

Entre os papéis/funções da sociedade civil, merecem destaque:
Ø fortalecimento de uma cultura de debate e de crítica;
Ø construção de um ambiente de liberdade de expressão, reunião e associação;
Ø criação e promoção de espaços de participação;
Ø agregação do componente de investimento humano e social às intervenções do Estado e do mercado;
Ø implementação de estratégias de influência no processo de decisão de políticas públicas;
Ø intervenção em processos de arbitragem e mediação social;
Ø identificação e exploração de oportunidades de participação criadas pelos processos de reforma institucional em curso no país (revisão constitucional, descentralização, educação, justiça, entre outras).

II – O Enquadramento legal da acção da sociedade civil
A Lei Constitucional consagra a instituição e operacionalização do acesso e uso efectivo e universal dos direitos, principal foco da acção da sociedade civil:
# os relativos à reprodução cultural (liberdade de pensamento e de expressão, de imprensa e de comunicação),
# os relacionados com a integração social (liberdade de associação e de reunião)
# e os que asseguram a socialização (protecção da intimidade e da privacidade, e da integridade pessoal),

para possibilitar o exercício formal da cidadania, a influência sobre os processos de tomada de decisão e as políticas públicas.

1. Princípios e premissas para a acção da sociedade civil
# Integração: aberto à participação de cidadãos e de OSC’s sem discriminações
# Não institucionalizado: o motor consiste na capitalização das experiências e os protagonistas são os cidadãos, as instituições e os processos
# Unidade: manifestação da vontade colectiva através de tomadas de posição
# Compromisso/sentimento de pertença: apropriação e consolidação da agenda pública
# Coerência e consequência: debate contínuo e dinâmica de análise-acção
# Abrangência e conhecimento: maior representatividade e capacidade das OSC’s
# Rapidez e flexibilidade na programação e na implementação: mecanismos não burocráticos e lineares
# Intervenção na perspectiva da procura, em particular dos excluídos: alargar as oportunidades de acesso e uso dos direitos, de inclusão na vida pública, e de transformar crescimento económico em desenvolvimento para todos
# Horizontalidade: não existe hierarquia.

A questão que se coloca é a de saber como institucionalizar procedimentos para a criação de um espaço de discussão e um ambiente de deliberação sobre o que cada um vai ser e sentir-se responsável por fazer. A resposta passa necessária, mas não suficientemente, por uma maior abertura de espírito ao particularismo e ao universalismo, permitindo criar responsabilidades assentes em subjectividades colectivas, organizadas solidariamente, num processo de permanente actualização e negociação dos termos do acordo, entre todas as partes envolvidas.

Reside na sociedade civil um enorme potencial de geração de mudanças sociais, esgotados que parecem estar os recursos dos sistemas político e económico para, de per si, provocarem ou conduzirem tal transformação. É na criatividade imanente da intersubjectividade colectiva, que reside a possibilidade de mudança social, independentemente do contexto em que tal transformação precise acontecer: quer se trate de sociedades avançadas ou atrasadas, de desenvolvimento acelerado ou tardio, a utopia de uma cidadania activa e inovadora, comprometida com sua memória social e procurando articular soluções modernas no quadro referencial das formas tradicionais de ser e de pensar, encontra-se na sociedade civil. Isto não significa descartar a participação, neste processo, de atores dos sistemas económico e político, bem como das organizações religiosas, lado a lado com a sociedade civil. Pelo contrário, não só é possível como necessária, tanto quanto desejada, mas não reconhecemos, em qualquer deles, a capacidade de liderança de um tal processo emancipatório, devido às suas próprias características distintivas.

III – Papéis específicos da sociedade civil nos processos eleitorais
Para além de uma acção continuada com vista:
# à democratização da sociedade, das relações sociais e de poder, que passa pela inclusão social e a promoção da cidadania universal a todos os angolanos – criação de oportunidades de acesso a bens colectivos e serviços públicos numa base universal -,
# à criação da instâncias de participação, aos diversos níveis da sociedade e sobre os mais diversos temas de interesse público - que exercita a democracia entre os que nelas participam, estimula o desafio à lógica dominante, amplia os espaços públicos através da diversificação dos actores e dos discursos, e produz oportunidades de troca de informações e troca de experiências, permitindo um conhecimento mais amplo dos problemas e das possíveis soluções para os mesmos -,
# à concepção e implementação de estratégias de influência com vista a vencer as resistências à participação que ainda prevalecem, não só por parte do Estado mas também por parte dos próprios cidadãos
# intervenções visando dar voz e visibilidade aos “invisíveis” e aos “sem voz”
# desenho de estratégias emancipatórias visando o acesso e uso efectivo dos direitos de associação, de reunião e de expressão a todos os cidadãos
# à interpelação do Estado e as suas instituições, visando a criação de condições de mudança do ambiente institucional, pouco permeável ao diálogo e ao estabelecimento de parcerias
# ao esforço colectivo - alimentado pela realocação dos recursos outrora destinados ao esforço de guerra -, com vista a transmitir confiança, compromisso e credibilidade, visando a melhoria dos padrões de vida, quantitativos e qualitativos, sustentados no desenvolvimento do capital humano e social de Angola
# identificar e implementar estratégias de pressão no sentido da melhoria das práticas de governação, nomeadamente a gestão transparente dos recursos públicos e a políticas distributivas dos rendimentos dos recursos naturais de todos, com incidência em investimentos públicos e combate à pobreza através dos processos de democratização e modernização da sociedade e de construção de cidadania ,
# à educação cívica dos angolanos - começando pela melhoria das práticas internas, exercitando os princípios democráticos que se defendem -, como forma de promover a auto-estima e desenvolver as capacidades de comunicação e de intervenção social dos cidadãos

A sociedade civil deve preparar-se organizacional e tecnicamente para os processos eleitorais em todo o País, com vista a:

  • Acompanhamento dos procedimentos legais de preparação das eleições, como criação da CNE, lei eleitoral, registo eleitoral, organização territorial e logística, bem como opções técnicas sobre as formas (manual, urna electrónica, contagem, recolha de urnas, etc.)
  • monitorização da implementação dos procedimentos e decisões de preparação das eleições
    interpelação aos partidos políticos acerca dos respectivos programas, candidatos e eventuais coligações
  • organização de debates públicos sobre os programas dos partidos e sugestão de alternativas às propostas apresentadas
  • denúncia de actos contrários ao espírito e ao disposto no quadro legal criado para as eleições e princípios democráticos universais (nomeadamente os direitos fundamentais)
    acompanhamento do acto eleitoral, funcionamento das assembleias eleitorais, mesas de voto, contagem de votos, anúncio dos resultados parciais e finais, e outras, através da sua participação sob o estatuto de “observador”.

Acima de tudo, a sociedade civil deve manter uma luta permanente e generalizada, com recurso aos mais diversos meios de influência da opinião pública, com vista à criação de condições para garantir a essência de eleições livres, nomeadamente:
- A manifestação da plena expressão da vontade política do povo angolano
- A realização regular de eleições, ou seja, a existência de um calendário eleitoral plurianual, que seja tornado público e devidamente divulgado pelos mais diversos meios de comunicação social
- A garantia de sufrágio universal, igual e não discriminatório (em discussão as questões de idade, nacionalidade, residência – diásporas – e capacidade mental, editado em lista eleitoral única
- Garantia da liberdade de participação em actividades, ou expressão de opiniões sobre campanha política, programas partidários, etc.
- A criação de um quadro jurídico-legal adequado às condições socioculturais e económicas dos eleitores, não inibidor ao exercício do direito de voto ou do direito de exercer um cargo electivo, prazos razoáveis para a realização das diversas etapas do processo eleitoral, e acesso equitativo aos meios de comunicação social, regras de financiamento das campanhas partidárias, proibir e punir práticas de intimidação e de corrupção
- A criação de um ambiente que paulatinamente promova a confiança no processo eleitoral.





Benguela, 28 de Maio de 2009.




28/05/2009

ORIENTAÇÃO SEXUAL NA CONSTITUIÇÃO ANGOLANA

Daniel Costa do O PAÍS, entrevistou o coordenador da OMUNGA sobre a inclusão da protecção dos direitos de orientação sexual no texto da futura Constituição. Esta entrevista foi publicada (não na totalidade) na edição n.º 28 de sexta-feira, 25/5/2009. Eis aqui na integra:


O PAÍS (OP): É verdade que a OMUNGA pretende que a questão da homossexualidade seja abordada no Parlamento?

José Patrocínio (JP): Na realidade a OMUNGA não levanta em exclusivo a questão da homossexualidade como assunto que seja abordado pelo parlamento, fundamentalmente para que seja tomado em consideração na futura Constituição do país. A OMUNGA preocupa-se evidentemente com os direitos humanos e muito com o que diz respeito com as minorias. Normalmente num país (como o nosso) em que somos habituados a pensar como maiorias, tudo (tod@s) que não faz parte dessas maiorias, simplesmente não são vistas como pessoas, nem sequer merecem respeito nem espaço para viverem, quase que viverem é um favor que as maiorias fazem em permitir-lhes esse mérito. A OMUNGA defende que, precisamente numa altura como esta, em que tod@s nós deveríamos estar envolvidos na produção da nossa futura Constituição, deveríamos estar ao mesmo tempo preocupados para que tenhamos um país para tod@s em que ninguém possa ser vítima ou beneficiar por qualquer que seja a razão e a sua diferença incluindo a de ORIENTAÇÃO SEXUAL (mais abrangente que a simples homosexualidade, como a bisexualidade). Ninguém, pura e simplesmente pode querer fazer negar a existência de tantos seres humanos com distintas orientações sexuais e que por tal razão, sofrem todo o tipo de discriminação e nenhuma garantia de protecção por parte dos órgãos responsáveis (antes pelo contrário são ainda mais vítimas de desprezo e humilhação).

OP: Os políticos dizem que não se trata de um fenómeno preocupante, concorda com essa posição?

JP: Não sei de que fenómeno está a falar, o da homossexualidade? Se é disto que está a falar, isto não é um fenómeno. É simplesmente um facto em que seres humanos têm diferentes orientações sexuais como temos também diferentes formas de ver e de estar no mundo. Temos vários gostos e várias sensações e sentimentos. Temos várias MUNDIVIDÊNCIAS. Por isso não é em si preocupante. O que é preocupante sim é que políticos ofereçam esse tipo de resposta que só em si demonstra ignorância absoluta sobre o assunto em questão. Haver homoxessuais não é problema, como não é problema haver negros ou católicos. Problema é se algum deles sofre alguma repressão, discriminação ou intolerância por ser homossexual, negro ou católico. Ninguém é mais que ninguém. O contrário também poderia ser dito (ninguém é menos que ninguém!!!!).Preocupante é quando um homossexual vai apresentar uma queixa a uma esquadra por ter sido vítima de um furto e o autor do crime declara de que a vítima é homosexual e o processo se inverte passando o assaltante a ser a vítima e a vítima a ser o criminosos pelo simples facto de ser homosexual. É triste é ter-se que houvir músicas a insultarem por e simplesmente as pessoas por serem homosexuais. Aceito que ninguém é obrigado a ter que aceitar qualquer outra forma de orientação sexual que não seja a sua, não aceito é que tenha que discriminar por tal facto ou não respeitar ou ter que agredir. Acho estúpido que as pessoas não consigam facilmente entender as diferenças, mas isto não me dá liberdade para que insulte um indivíduo porque se sente macho (ou machão), mesmo que seja corno.

OP: Como acha que se deve introduzir a questão da orientação na constituição?

JP: Não vejo nenhuma forma específica para introduzir esta questão da orientação sesual na constituição, como não vejo qualquer forma específica para introduzir a questão dos San na constituição ou para dizer que qualquer grupo maioritário, como os bantus, podem negar a existência e os direitos de todos os outros grupos etnicos, incluindo os descendentes de europeus. Todos estamos claros que temos e sempre teremos um país de diversidade. Também Hitler e as grandes ditaduras atiraram as suas raivas contra a diferença e os de homossexuais foram vitimas prioritárias (ao lado dos judeus e russos) das SS e Gestapo. O mesmo ocorreu com Mussulini e em todas as ditaduras. Julgo que o nosso país não pretende igualar-se a nenhuma destas ditaduras em que vamos atirar os homossexuais para os campos de concentração. O que há nos homossexuais para os transformar em nossos horriveis inimigos? Falamos de paz e pacificação, como continuamos a ver potenciais inimigos pelas nossas diferenças de ser e de pensar?


OP: Já abordou algum político ou partido sobre esse propósito? E qual foi a reacção dos políticos ou dos próprios partidos?

JP: Pessoalmente (e mesmo como OMUNGA) não abordei este assunto com algum político ou partido como tal. Penso que não haverá respostas iguais. Acredito que haverá quem concorde e quem discorde. Haverá quem pense que deve-se defender e quem ache que se deve condenar. Dependerá muito da nossa força para que o bom senso e o valor humano do indivíduo seja considerado acima de qualquer outro interesse e por isso termos claro que em Angola, todos os cidadãos serão tratados como iguais perante a lei e os outros cidadãos, independentemente da raça, do sexo, idade, origem sexual e qualquer que seja a diferença ....... Por exemplo, não sei qual é a sua orientação sexual, mas isso importa? Será que você não consegue desenvolver a sua profissão com profissionalismo igual a qualquer outra pessoa (de sexo diferente ou de qualquer outra orientação sexual diferente da sua)? Eu e você, deixamos de ser inteligentes mesmo que possamos ter formas de estar diferentes? Deixámos de ser humanos? Fico sempre abismado quando me confronto com comportamentos discriminatórios, sejam de que tipo forem e pior ainda quando são para comigo. É duro, batante duro sentires-te não aceite pelos outros que ocupam todo (ou fazem por ocupar) o espaço de decisão e protecção. No outro dia estava a ver o documentário ("da terra, da Água e do fogo") sobre os San (aconselho que vejam, inclusivamente um outro documentário sobre os San que também é do mesmo realizador, Richard Paklepa, "Quando os primeiros são os últimos") em que uma menina San explicava porque é que tinha deixado de ir à escola. As outras crianças bantu insultavam-nas e diziam que cheiravam mal. Alguém já se sentiu assim? Se sim, então entende o que estou aqui a dizer.


OP: Essa solicitação da orientação sexual estará ligada ao crescimento do casos de homossexualidade?

JP: A inclusão do respeito pelos direitos das minorias, incluindo os de orientação sexual (que não sei sequer se é ou não uma minoria. Quem tem dados sobre isso? Quem me garante que o aparante machão não é um simples homossexual? Quantos chefes de família se escondem nesse disfarce para durante a noite se aquecerem no corpo de outro homem? Quantas mulheres, mães e avós, não se amolecem nos carinhos amorosos da vizinha? Quem sabe o quê????), não tem a ver com o aumento ou a diminuição, tem a ver com a sua existência.Quando falamos dos San não estamos a falar porque eles estão a aumentar, antes pelo contrário, estamos assustados porque eles estão a desapararecer e eles merecem viver. Não é porque aumenta ou porque diminui. É porque são Seres Humanos como eu, tu e os políticos, mesmo que não sejamos todos tão estúpidos e tão mesquinhos! A discriminação em relação à orientação sexual também tem a sua origem na religião (quer na teoria do machismo). A igreja católica por exemplo não aceita a homossexualidade mas apoia a abstinência que no meu entender poderia ser entendido como mais nefasto porque é castrar a vontade sexual de um indivíduo desde o seu pensamento e comportamente. O esconder os apetites sexuais (poderemos ouvir os psicologos e psiquiatras), pode ser desastroso para quem o faz, como para todos aqueles que poderão vir a ser as suas vítimas das suas desastrosas reacções. E aqui a igreja não protesta, antes pelo contrário. No entanto poderemos também deixar isso como um direito de escolha. A orientação sexual não é uma escolha, é-se e simplesmente é-se. É como ser-se alto ou baixo e tanto um como o outro não são anormais mesmo que se possa dizer que a altura média está acima da do baixo e abaixo da do alto. A média é feita tomando em conta os altos e os baixos. É como a orientação sexual!!! Possivelmente o que existe em maior número nem são os heterossexuais nem os homossexuais mas os bissexuais. Contem e depois digam. Se o "fenómeno" (como disse) existe, estudem-no!


OP: Acredita que as autoridades angolanas não estão a dar um tratamento devido ao caso?

JP: O que penso é que os políticos angolanos apenas olham para os seus interesses políticos e pessoais. Temos agora o caso da Constituição. Está em curso o processo constituinte e ninguém sabe o que está a acontecer. Nem os políticos têm interesse que as pessoas saibam nem que participem. Se tal acontecer pode pôr em causa interesses bem privados como tirar o direito aos camponeses sobre as terras para que os grandes latifundiários possam actuar. Ou outras coisas do género que são conquistas democráticas mas que o poder neste momento não tem qualquer interesse que isso continue porque põe em cheque os seus interesses enquanto também proprietários de empresas. As autoridades angolanas não estão a dar atenção nenhuma ao povo, às pessoas, aos cidadãos. Dão atenção apenas àqueles que fazem parte desse mesmo poder ou que podem dar vantagens a esse poder. É ver-se a política de desenvolvimento do país? de desenvolvimento rural? para onde nos estão a querer levar? Obviamente que a questão da orientação sexual é mais uma das questões que não tem sido de interesse das autoridades. Mas possivelmente até tenham interesse porque a homossexualidade (e outras formas de orientação sexual) não é exclusiva de pobres ou povo em geral. Temos decerteza muitos polític@s ou filhos e filhas de polític@s homossexuais (muitos deles vemos na televisão!!!!!! Em diferentes canais!!!! Eles até deveriam fazer o lobbyng por esta causa). O problema é que ess@s filh@s de polític@s não passam pelas cadeias, esquadras ou pelas diferentes instituições e por isso não sentem os insultos que tantos outros sentem. se calhar nem andam a pé pelas ruas da cidade. Antes pelo contrário, mesmo que não sejam aceites, os outros políticos (lambe botas dos seus pais) abrem-se em sorrisos quando el@s surgem. É o cinismo que tem que acabar. Ou se aceita a homossexualidade de uma vez por todas ou não vale a pena andarmos neste faz de conta. O racismo e qualquer tipo de discriminação tem que ser legalmente julgável e punivel. É tão somente isso. Porque não?

OP: Concordaria com a legalização de casamentos entre as pessoas do mesmo sexo?

JP: Eu pessoalmente não sou a favor de casamentos (sejam heterossexuais, sejam homossexuais). Não penso em casar-me, mas penso sempre em ter alguém comigo. É bom para mim ter companhia. Ter o aconchego de alguém. Sentir o cheiro de aguém e o seu calor. Sonhar com alguém, mas não creio muito em casamentos e casamentices.No entanto não vejo porque qualquer ser humano que sonhe casar não o faça mesmo que seja entre pessoas do mesmo sexo. Porque não?

OP: Quais são os dados que possui sobre o assunto a nível da província de Benguela e arredores?

JP: Quais dados? Quantos animais da espécie existem? Se estão em vias de extinsão? Não! O que digo simplesmente é que não podemos continuar a admitir outros seres humanos e nós mesmos, sermos maltratados na nossa própria terra apenas porque somos diferentes uns dos outros, por qualquer que seja a razão. A Nação que construimos tem que se fundamentar na justiça, na igualdade, no respeito e na tolerância. NA DIFERENÇA. Não poderemos querer ter um país de clons, de repetidos e simplesmente os mesmos. Se estes os mesmos, os iguais, os repetidos e /ou os clons existem e ocupam os cargos políticos e de decisão, precisamos de simplesmente demonstrar-lhes que para além deles existem os diferenstes, os outros, os próprios, os verdadeiros os que se são e se querem e se amam e não aceitam nem ademitem que os neguem.

OP: Algumas pessoas acreditam que o homossexualismo também virou moda. Partilha da mesma opinião?

JP: Penso que sabe qual é a minha resposta. mas como sei que a resposta que quer (de mim) não é para si mas para quem lê o jornal para o qual trabalha, vou tentar (diga-se de verdade que faço um grande esforço) responder, ou dar algumas dicas.A orientação sexual não pode virar moda ou seja, as questões relacionadas com o sexo, apetites sexuais, sensações sexuais, comportamentos sexuais, etc, etc., não se adopta como moda. Ir-se por aí (tal como disse atrás) é ir-se pelos ignorantes caminhos da ignorância (para além de atrevimento e maldade).Ninguém pode dizer porquê que gosta de fazer sexo assim ou assado (a não ser que diga simplesmente: porque gosto ou não gosto). Ninguém vai dizer: "antigamente adorava fazer sexo com mulheres mas agora, por causa da moda, só adoro fazer sexo com homens". Ninguém. Qualquer ideia semelhante a isto é pura e simplesmente desconexada da realidade. Burrice pura. Não discordo que cada vez mais as pessoas adquirem coragem para realçar a sua orientação sexual. Cada vez menos encontramos homens que se sentem obrigados a casar por causa da sociedade, da família, do emprego, dos amigos e de, de, de, e assumem a sua orientação sexual. Isto não é significado de que a homossexualidade aumentou, apenas diminuiu a mentira e o escondido vem a público. Cada vez mais temos uma sociedade corajosa, em que já não aceita fazer aquilo que os outros querem que se faça mas assumem aquilo que querem e por isso sentem o peso da discriminação. Isto tem que acabar. ninguém pode obrigar alguém a ser o que ele não é. Ninguém pode obrigar um negro a ser azul ou um católico a ser extraterrestre.

24/05/2009

QUE DESENVOLVIMENTO RURAL? - Cristiano Luis

CRISTIANO LUIS é presidente do Núcleo Representativo das Associações do Dombe-Grande e foi um dos prelectores do QUINTAS DE DEBATE de 14 de Maio de 2009, sobre o tema QUE DESENVOLVIMENTO RURAL? Eis o texto na íntegra:

1 - INTRODUÇÃO

a) CARACTERIZAÇÃO ETNO-HISTÓRICO

Do ponto de vista sócio-cultural, o Dombe-grande é uma área tradicional de pastores Helelo representados por uma importante comunidade Ndombe. Actualmente, com cerca de 85000 habitantes, muitos deslocados, a essencial população sedentária é oriunda de todos os cantos do país. Reduzida a 3%, a população nativa Mundombe está confinada fundamentalmente nas povoações do Kangengo e Luacho. Entretanto, mais de 20000 deslocados Ovimbundu penetraram no Luacho até meados de 1999.

Além dos Ovimbundu, de todas origens: Vawambu, Vambokóyo, Vambalandu, Vacinji, Vakakonda, Vakaukembe, Vaciyaka, Vangalagi, Vahanya e Vacilenge, a região tem conhecido a rpesença efectiva dos Lunda/Tchókwwe, Valwimbi, Ambundu, Vanyaneka-Nkhumbi, Vacipungu, Vacilenge-Nkhumbi e Vakwandu cuja prática agrícola destas comunidades acabou por superar a tradicional pastorícia.

b) CARACTERIZAÇÃO SOCIO-ECONÓMICA

A hegemonia da região no processo de tráfico de escravos (primeiro com os nativos e posteriormente com penetração no sertão), a partir de 1836 começou a decair e os europeus e os residentes passaram a um novo contexto social e económico influenciado pela fertilidade das terras em redor da foz do rio Koporolo, ao ponto de se fazer agricultura industrializada já no final do século XIX.

Para além da produção de coconote, algodão, sisal, açúcar, aguardente, mandioca, batata, milho, animais, sal e produtos do mar, a partir de 1896 só o Luacho controlava um importante fabrico de óleo de palma de exportação o que a partir de 1926 levou a administração local a criar uma delegação dos serviços aduaneiros no porto do Kuyu de onde se exportava a produção da companhia açucareira.

Além de inúmeros agricultores particulares europeus que afluíram à localidade, muitos nativos continuaram com as suas actividades tradicionais relacionadas com a criação de gado e o amanho da terra. Com o estabelecimento efectivo da Companhia Açucareira, a vida passou a conhecer radicais mudanças sociais.

Aumentou o nível de exportação de produtos locais. Consequentemente, o êxodo populacional vindo do interior, serviu de mão-de-obra barata.

2 - DESENVOLVIMENTO RURAL

Desenvolvimento Rural (DR) não é mais senão potenciar, estimular, valorizar, preparar, capacitar e proporcionar todas as condições indispensáveis do crescimento multifacético das aldeias, comunas, povoações e bairros.

Estas condições indispensáveis e básicas são, entre outras, a energia e a água potável, a educação e a saúde, a habitação, os bancos, as lojas e os serviços de identificação, os meios de transporte e de trabalho.

Criando estas condições na zona rural, estaremos também a desenvolver de facto (e estancar o êxodo rural) e criaremos condições para o povo (os camponeses) que, durante o período do conflito, acumularam-se nas cidades onde oferecia segurança.

Apetrechando o meio rural, não haverá necessidade da população se concentrar nas áreas urbanas e se calhar podemos montar um processo contrário, o êxodo urbano. Por exemplo, antes de 2000 só se estudava no Dombe-grande até à 8.ª classe e quem tivesse possibilidades iria prosseguir os estudos nas cidades de Benguela ou Lobito. Concluídos os estudos já não regressavam mais. A partir de 2004, com a instalação do ensino médio, verifica-se elevado número de jovens a virem do Lobito, Benguela, Lubango, B.ª Farta, Huambo e outras localidades.

Com a instalação de infra-estruturas adicionais de comunicações (Unitel e Movicel) e agora a reabilitação da estrada Dombe-grande/Benguela, pode ser o início do desenvolvimento.

O meio rural como fonte de matéria prima deverá merecer de todos, as condições que se encontra nas cidades. O que é que motiva o despovoamento das áreas rurais? É a falta de condições básicas. Existe grande discriminação. Os homens pensam que as pessoas que vivem nas cidades são mais importantes em relação aos que vivem no campo.

Mesmo na distribuição das rubricas orçamentais do Estado, vemos que há discriminação. Outra discriminação do meio rural, constata-se na educação, no que toca aos bolseiros para o ensino superior. O Dombe-grande nunca foi contemplado.

O meio rural necessita de água potável e energia para pôr fim às doenças diarreicas, assistir a televisão e ouvir rádio, para se actualizar do que se passa no seu país e mais além.

O meio rural necessita de educação e saúde mais próximo e não na distância de 10 a 60 Km e sem ambulância. O homem do campo precisa de uma boa casa construída pelo Estado ou por ele próprio com financiamento do banco que tem que estar na sua área e não nas cidades onde tem muito movimento de viaturas e muita burocracia e requisitos duros (complexos).

O homem do campo precisa do Ministério da Justiça na sua comuna para tratar da sua cédula e do BI, para adquirir a cidadania.

O homem da comuna, da povoação fica satisfeito quando encontra facilidade do crédito dos inputs para a sua lavoura e meios de transporte para evacuar o seu produto.

O meio rural necessita de ser promovido e estimulado pelo Estado através de organismos afins. Não é favor mas sua obrigação!

O homem do meio rural necessita, enfim, de ser capacitado com novas tecnologias para rentabilizar a sua produção e adaptar às novas exigências do mercado e ser autónomo das suas políticas. Cumprindo com estes pressupostos estaremos efectivamente a fazer a política do Desenvolvimento Rural.

Muito Obrigado

22/05/2009

Como serão eleitos os representantes locais nas futuras Autarquias em Angola? A nova Constituição legitimará este Poder Local?

Belisário dos Santos


A descentralização administrativa tem sido implementada com base na hipótese de que ela venha resultar em decisões que tenham impacto na satisfação das necessidades e prioridades locais. A democracia representativa ainda tem sido o principal mecanismo para a resolução de tais prioridades locais. Também é sabido que a maior parte dos sistemas de governos locais normalmente oferecem poucas outras oportunidades de participação dos cidadãos na vida pública e de prestação de contas pelos respectivos governos locais (eleitos ou indicados).

Em Angola, a questão chave neste momento e que deve ser preocupação de muitos de nós, é acerca da natureza e estrutura da futura Governação Local Descentralizada. Embora a Constituição venha a ser revista, provavelmente o processo vai preocupar-se mais com o tipo de relações entre os diferentes níveis de Governo. Estamos quase todos anciosos de que o rápido processo em direcção à desconcentração e descentralização venha continuar e, que a forma/estrutura das Autarquias Locais venham igualmente merecer uma discussão. Certamente que as actuais experiências "pilotos" sobre governação municipal participativa a serem apoiadas pelos diversos actores (ADRA, DW, CARE, Save the Children) incluindo agências do Governo (FAS) e das Nações Unidas (PNUD) irão alimentar este processo. Se as eleições autárquicas ao nível local serão com base nos eleitores do respectivo território (município) ou com base em listas partidárias, esta será uma questão chave a debater-se durante este período de revisão da Constituição. Duas hipóteses: primeira, se as eleições autárquicas forem com base nos eleitores locais a vantagem é que os membros eleitos terão uma relação mais directa com os eleitores, serão facilmente cobrados pelos eleitores das responsabilidades assumidas e os eleitores terão a quem pedir contas (importante para uma governação local, porque ao nível nacional já existem os partidos políticos como representantes dos eleitores). Segunda, se forem com base em listas partidárias, não haverá muitas garantias de ligação entre os membros eleitos e os eleitores, porque os eleitos tenderão a prestar mais contas e atenção a quem os colocou na lista (distanciam-se dos problemas dos cidadãos, incluindo dos militantes).

Basicamente, a maneira como a Constituição determinar a forma de eleição do Presidente da República, provavelmente também determinará o tipo de Autarquias Locais! O risco é o da transferência do poder partidário do nível central para o nível local e, isso pode influenciar negativamente na democracia participativa ao nível local. Está aberta pelo próprio Governo, mais uma oportunidade para a Sociedade Civil e o Sector Privado participarem deste importante exercício de revisão da nossa Constituição. O nível de autoridade, alocação de recursos e linhas de responsabilidades (sobretudo a prestação de contas) dos diferentes níveis do Governo também precisarão ser identificados e clarificados pela "nova" Constituição. Que níveis (municipal, provincial, parlamentar, Chefe de Estado) serão eleitos ou indicados, ou ainda escolhidos através de uma certa combinação daqueles níveis? Isto também precisará de ser definido. Provavelmente haverão alguns dilemas. E a própria descentralização ficará apenas ao nível do município ou também a outros níveis? Também é outra questão. As autoridades tradicionais aparecerão como cidadãos eleitores, nas listas partidárias ou terão um tratamento especial?

Antes das eleições de 1992, os debates à volta da Constituição haviam sugerido recomendações de vários partidos políticos, dentre elas a eleição dos governadores provinciais e várias outras propostas que iam desde alguma forma de federalismo a um sitema presidencial altamente centralizado. E foi a oposição que "persuadiu/pressionou" a colocação deste debate na prateleira e ser retomado logo após as eleições parlamentares ( na esperança de que viesse a ter uma posição mais forte). Naquela altura, a Comissão Constitucional criada tinha uma representação proporcional baseada na distribuição de assentos parlamentares. Desta vez, apesar da recém criada Comissão para a revisão da Constituição continuar a ter representação de todos os partidos com assentos parlamentares, de todo o modo, o peso já não é o mesmo! E aquelas propostas feitas em 1992 voltarão ao actual debate ou não?

Finalmente, a intensão de avançar rapidamente com a reforma constitucional, mesmo antes das eleições presidenciais, sugere que há uma intensão consolidar ou pelo menos tornar oficial a concentração de poderes presidenciais que têm sido acumulados desde as eleições de 1992.

19/05/2009

DEMOCRACIA, ELEIÇÕES E CIDADANIA: O que é necessário para que eleições signifiquem democracia? O papel da SC no equilíbrio político.

REF.ª: OM/ 121 /09
LOBITO, 20 de Maio de 09

NOTA DE IMPRENSA

Hoje é comum falar-se de democracia em vários países de África, sem, no entanto, tomar em conta aquilo que são os seus atributos principais: a liberdade de imprensa, a liberdade de opinião, de reunião e por último, a participação. Em volta disso, como é que podemos visualizar o nosso país? A sociedade civil tem espaço de expôr as suas ideias? Em concordância com um académico da nossa praça em que dizia “os angolanos precisam fazer o seu país” para isso é necessário a mão de todos os angolanos.

A vida em sociedade significa interiorizar aquilo
que são os valores fundamentais
e pô-los em prática.

QUINTAS DE DEBATE pretende juntar diferentes visões sobre temas da actualidade como política, economia e sociedade. Acompanhe no dia 28 de Maio a partir das 15 horas, no SOLAR DOS LEÕES-BENGUELA, será realizado mais um Quintas de Debate, com o tema:
DEMOCRACIA, ELEIÇÕES E CIDADANIA: O que é necessário para que as eleições signifiquem democracia? O papel da sociedade civil no equilíbrio político.

Será Prelectora: Tina Abreu

PARTICIPE E DIVULGUE
João Malavindele Manuel
Coordenador do CID

O OMUNGA agradece a todos os prelectores por se disponibilizarem de forma voluntária a darem as suas contribuições, como ao Pambazuka, Club K e Nova Águia, pela abertura no acompanhamento e divulgação dos debates.

Conta com o apoio da Christian Aid e PROMODES

Poderão ainda acompanhar os debates, acedendo aos textos, comentando, questionando, sugerindo ou criticando através do http://quintasdedebate.blogspot.com ou ainda www.club-k-angola.com e www.pambazuka.org. Para mais contactos podem aceder ao terminal telefónico +00 244 272221535, ao móvel +00 244 917212135 e aos email quintas.de.debate@gmail.com, omunga.coordenador@gmail.com e omunga.cid@gmail.com.

18/05/2009

QUE DESENVOLVIMENTO RURAL (DR) PARA ANGOLA?

Francisco Eduardo e Carlos Figueiredo, Maio 2009


INTRODUÇÃO

A apresentação deste tema no dia 14 de Maio, 10 dias após a realização da conferência sobre o Desenvolvimento Rural, visa essencialmente continuar a animar o debate sobre o assunto, e não tem a pretensão de ser uma apresentação puramente teórica, tão-pouco académica.

A nossa apresentação terá três partes:

uma introdutória;
  • uma parte sobre o desenvolvimento rural em Angola;

  • uma parte final, mais conclusiva.

Clarificando o que entendemos por desenvolvimento, comecemos por explorar este conceito de desenvolvimento, sobre o qual todos falamos (atribuindo-lhe geralmente sentidos muito diferentes).

Schumaker, no seu livro “O Pequeno é Belo”, defendia, já na década de 70, que desenvolvimento é algo que assenta em três pilares, (1) conhecimento, (2) organização e (3) disciplina. Defendia também que daqueles três pilares juntos resulta a capacidade para produzir infra-estruturas e equipamentos complexos. É importante clarificar que estas infra-estruturas e equipamentos complexos são como que um subproduto do desenvolvimento; subproduto que por sua vez contribui para o processo de desenvolvimento e assim sucessivamente (criando o “ciclo virtuoso”).

Ou seja, sem aqueles três pilares, que estão, todos eles, na sociedade e nos seus indivíduos, os equipamentos e infra-estruturas mais robustos, esfumam-se rapidamente. Assim, investir em equipamentos e edifícios, sem o devido investimento no real desenvolvimento que os pode sustentar (conhecimento, organização e disciplina), pode resultar em algo equivalente a despejar água na areia.

Delimitando o rural

O conceito de rural está frequentemente associado às zonas onde a (1) actividade económica principal está no sector primário (agricultura, pescas, pecuária, etc), onde a (2) densidade populacional é baixa, onde a (3) oferta de serviços é limitado (energia eléctrica, água, comunicações, etc), e onde as (4) relações sociais são normalmente marcadas por uma maior coesão com um papel mais marcado para o grupo (e não para o indivíduo). Isto por contraposição às zonas urbanas onde as actividades económicas principais se desenvolvem no (1) sector secundário e terciário (industria e serviços), as (2) densidades populacionais são elevadas, (3) oferta de serviços permite um acesso praticamente universal e onde (4) o individuo beneficia de maior autonomia (sofrendo menos pressões do grupo restrito a que pertence).

Um terceiro conceito, importante para os países em vias de desenvolvimento, mas que não desenvolveremos aqui, é o de zonas peri-urbanas. As zonas crescentes de elevada densidade populacional de pessoas frequentemente envolvidas em actividades terciárias (serviços informais), mas com um baixíssimo nível de acesso a serviços. Tais zonas parecem ser o subproduto natural de políticas de desenvolvimento que não valorizam o rural, ou quando o fazem, esquecem-se que são as pessoas o fundamental do desenvolvimento.

No conceito de rural acima apresentado, fica claro que as zonas rurais dos países industrializados possuem traços de urbanização que zonas peri-urbanas (e mesmo as urbanas) dos países em vias de desenvolvimento (chamado de “subdesenvolvidos” por alguns) almejam por ter. Um outro aspecto comum nos países em vias de desenvolvimento é a existência de “bolsas” urbanas dentro de zonas eminentemente rurais e “bolsas” rurais dentro de zonas essencialmente urbanas.

O DESENVOLVIMENTO RURAL EM ANGOLA


Já no tempo colonial, o Engº Herman Possinger[1] dizia aos colonos algo como “será muito mais económico investirem no desenvolvimento dessas pessoas (do meio rural) do que terem mais tarde que investir em meios para lidar com a sua revolta…”. Este argumento que parece meio cínico (pois coloca a tónica não no que é mais ético e justo, mas sim no que é mais económico), parece ser dolorosamente actual.

Em documentos recentes do Ministério da Agricultura, reconhece-se que a agricultura familiar é responsável por valores entre os 95 aos 98% da produção (cereais, leguminosas e tubérculos) agrícola, contra valores entre os 2% aos 5% por parte dos fazendeiros. Infelizmente, não temos dados sobre o valor investido pelo Estado nestes dois tipos de agricultura; porém, olhando para os dois tipos de agricultura podemos sem grande margem de erro inferir que os fazendeiros beneficiam de uma fatia do investimento público desproporcionadamente alta para o contributo real que dão à produção agícola nacional.

A que tipo de serviços (de ensino, saúde, bancários, comunicações, etc) têm acesso as famílias camponesas? Qual o volume global de crédito que é dedicado às famílias camponesas? Qual o investimento feito na investigação e extensão que se concentre nos problemas dos pequenos camponeses? A resposta a estas perguntas poderá ajudar a clarificar de que modelo de desenvolvimento rural se está a aplicar na prática.

Ao nível da organização, como pilar do desenvolvimento, devemos olhar também para as relações sociais no meio rural. Estimular o associativismo na zona rural e os mecanismos que permitam aos camponeses defender os seus interesses nos momentos em que se negoceiam as prioridades, é um aspecto importante do desenvolvimento rural. Em que medida muitos destes mecanismos associativos[2], funcionais nas nossas zonas rurais, não funcionam e perpetuam uma lógica excessivamente hierarquizada e “clientelista” que é contraditória com os princípios do cooperativismo?

O desenvolvimento rural é Multidimensional. Para ser bem sucedido necessita de estratégias de uma base larga. Desenvolvimento rural significa, na prática, a promoção de aspectos económicos, ecológicos, sócio-culturais e politico institucionais em igual medida. O DR deve ajudar a melhorar a segurança alimentar, promover a educação e saúde; deve criar rendimentos e oportunidades de emprego. O objectivo final é habilitar as pessoas nas regiões rurais a aumentarem a sua possibilidade de escolha, delineando os seus próprios métodos e soluções sustentáveis. A criação de uma Secretaria de Estado para o Desenvolvimento Rural com esta perspectiva integradora das várias dimensões do desenvolvimento rural, é algo promissor. Mas será necessário enfrentar influentes correntes de pensamento que entendem desenvolvimento como introdução de equipamentos e construção de infra-estruturas.

CONCLUSÃO


Assim, e utilizando o modelo proposto por Schumacker, que referimos no início, defedemos que o desenvolvimento rural angolano deve ser promovido pelo investimento nestes três eixos.

Conhecimento, através de


· Bom ensino rural. Acesso universal a ensino de qualidade, com conteúdos ligados com a vida das pessoas, e dando possibilidade de progressão académica (escolas técnicas e vários níveis de ensino) que ofereça habilidades para enfrentar os desafios das zonas rurais.
· Pesquisa e extensão que dê apoio à maioria – as famílias camponesas
· Pesquisa que permita conhecer a realidade - estatísticas agrícolas, estudos vários.


Organização, essencialmente numa lógica de apoio à auto-organização:


· Associativismo e cooperativismo real – assente em pressupostos de transparência relativamente aos estatutos, procedimentos e sem coerção exercida por qualquer entidade local ou de nível superior.
· Serviços especializados para tratar de várias funções como crédito, cadastro, comercialização, processamento. Muitos destes serviços podem e devem ser fornecidos por privados ou cooperativas mas o Estado pode fomentar esta auto-organização do meio rural, através do desenvolvimento de serviços.
· Colocar em funcionamento os mecanismos de participação e controlo político que permitam ir criando as bases para um real controlo social.



Disciplina, numa lógica de respeito pela justiça e pela igualdade de direitos:


· Cumprimento da lei já seria um bom começo... especialmente importante no que toca ao acesso à terra e às leis que regulam a protecção ao ambiente e ao uso dos recursos públicos (OGE).
· Travar a tendência para que a “lei do mais forte” se sobreponha ao direito, seja ele o tradicional seja o positivo.

Aumentar a consciência das vantagens de seguir este modelo de desenvolvimento, e os riscos e custos dos modelos centrados na modernização acelerada e no foco nas infra-estruturas e tecnologias importadas, é uma tarefa que necessita do empenho de todos nós.











[1] O líder da “Extensão Rural de Angola”, um projecto que teve um enorme impacto, em termos de desenvolvimento rural, no Planalto Central Angolano
[2] Associações e “cooperativas”

PROCESSO CONSTITUINTE: Democratização das Autoridades Tradicionais, é possível?

Por questões técnicas ainda não nos foi possível transcrever a apresentação do prelector padre VIRGÍLO JOAQUIM CANÁRIO do QUINTAS DE DEBATE de 30 de Abril de 2009. Tão logo que seja possível apresentamo-lo neste espaço.

Pedimos desculpa pelo transtorno que tal facto possa trazer. Tentaremos ser breves.

José Patrocínio
Coordenador-geral
OMUNGA

DESENVOLVIMENTO E CRESCIMENTO: Qual o significado? Convergências e Divergências!

Por questões técnicas não nos foi possível até ao momento transcrever a apresentação do facilitador GUILHERME SANTOS do QUINTAS DE DEBATE de 16 de Abril de 2009. Logo que nos for possível, publicaremos neste mesmo espaço.

Pedimos as nossas sinceras desculpas por todo o transtorno que possa causar tal facto. Prometemos não demorar.

Coordenador-geral

José Patrocínio

OMUNGA RECLAMA SOLUÇÃO URGENTE PARA MORADORES DE RUA DO LOBITO

REF.ª: OM/___118____/09
LOBITO, 18 de Maio de 2009
NOTA DE IMPRENSA

PESSOAL DA COMISSÃO EUROPEIA CHOCADO
COM O QUE VIRAM EM BENGUELA

Uma delegação da Comissão Europeia, chefiada pelo Sr. Embaixador João Gabriel Ferreira, visitou a província de Benguela a 27 de Abril de 2009, com o propósito de acompanhar os projectos dos seus parceiros financiados pela CE.

Durante a visita, a delegação deslocou-se ao antigo Centro 16 de Junho (B.º da Lixeira), local de assentamento de jovens moradores de rua e área de intervenção do projecto JUVENTUDE E CIDADANIA implementado pela OMUNGA e financiado pela CE através do Instrumento Europeu para Democracia e Direitos Humanos.

Na base desta visita, a Sra. Áurea Machado, membro da Comissão Europeia e integrante da equipe visitante, distribuiu uma carta aberta à 9.ª Comissão da Assembleia Nacional, onde expressa a sua indignação em relação às condições em que encontrou a viver os jovens em situação de rua assentados actualmente no ex. centro 16 de Junho, B.º da Lixeira, Lobito. (em anexo)

A subscritora termina a sua carta realçando: “Preocupação sim com a reconstrução das infra-estruturas do País, bastante visível, mas preocupação, acima de tudo, com o tecido social e humano.”
A OMUNGA vem mais uma vez a público apresentar a sua preocupação em relação às graves condições em que vivem estes jovens e todos os outros que até ao momento não aceitaram o processo da administração municipal de assentamento dos moradores de rua e que continuam a viver nas diferentes paradas existentes pela cidade do Lobito.

A OMUNGA reclama mais uma vez pela elaboração urgente de um plano municipal de inserção dos moradores de rua respeitando a dignidade humana e tendo como ponto focal o indivíduo.

Para mais informações, podem contactar:

José A. M. Patrocínio

Coordenador-geral

PESSOAL DA CE CHOCADO COM O QUE VIU EM BENGUELA

CARTA ABERTA À 9ª COMISSÃO DA ASSEMBLEIA NACIONAL
(COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS, PETIÇÕES, RECLAMAÇÕES E SUGESTÕES DO CIDADÃO)

Excelências,

Tomei a liberdade de rabiscar este pequeno artigo, em jeito de carta aberta dirigida à vossa comissão, atendendo às suas atribuições. Numa passagem rápida pela província de Benguela, por inerência das actividades que desempenho, visitei no dia 27 de Abril de 2009 alguns projectos sociais ali desenvolvidos.

Um deles, denominado Promoção dos Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiências nas províncias de Benguela, Huíla e Huambo, cujo beneficiário é a Liga de Apoio à Integração dos Deficientes (LARDEF), tem como objectivo contribuir para a integração social e económica das pessoas portadoras de deficiências, sendo, por isso, um dos principais resultados esperados, que as pessoas portadoras de deficiência conheçam os seus direitos, através das leis.

Por ocasião da visita, deparei-me com um grupo de mulheres que, até ao momento, a única coisa que as diferenciava de mim era a paralisia dos membros. É um grupo que está associado ao projecto da LARDEF, mas que tende a tornar-se numa associação angolana de integração de mulheres com deficiência. Estavam elas um pouco tímidas com a nossa presença, mas firmes nas suas decisões, ternas, amamentando algumas os seres dependentes.

Diziam:
“Nós estamos a estudar, precisamos de nos formar para ajudarmos outras mulheres com a nossa condição, que vivem nos outros municípios, precisamos de trabalhar, solicitamos créditos mas os juros são muito altos quando nos são concedidos então desistimos. Fazemos costura quando nos aparecem clientes, mas ficamos paradas muito tempo pois a matéria prima para fazermos artigos para revenda não está ao nosso alcance. E nós não estamos só preocupadas com os nossos direitos, precisamos de conhecê-los sim, mas acima de tudo a nossa ânsia é a formação, para também termos em conta OS NOSSOS DEVERES”.

“Estão a ser construídos muito edifícios sem se ter em conta a adaptação às necessidades das pessoas com deficiência, escasseiam os meios de compensação. O que for feito não significa que será apenas para nosso benefício, nós já nascemos com essa condição e estamos a sobreviver, é importante dizer que poderá ser para benefício de todas as pessoas pois a vida prega muitas partidas e a cidadã ou o cidadão com todos os seus membros hoje, poderá amanhã ser um cidadão ou cidadã como nós. E o que sucederá?”. Isto marcou-me deveras e deixou-me a pensar: como é estranha a natureza humana! Pessoas que poderiam estar depressivas, que sofrem algumas descriminações, mas que têm muita vontade de viver e de vencer. Que nobreza, o sentido da utilidade e da contribuição para o desenvolvimento do país, apesar de tudo.

Sras e Srs, estas e estes cidadãs/ãos, aguardam, há cerca de quatro anos, de acordo com a informação prestada pelo coordenador do projecto, por resultados da Lei Base para a Pessoa Portadora de Deficiência. Com certeza que no pretérito dia 5 de Setembro de 2008 pensaram: vamos votar para legalmente ser eleito aquele que dará seguimento ao que aguardamos há bastante tempo. Esperançosos estavam.

Continuando o programa, foi visitado também o antigo centro 16 de Junho, no Lobito (bairro da lixeira), actualmente local de assentamento de jovens moradores de rua, com péssimas condições de habitabilidade, onde os jovens e suas famílias residem em tendas, muitas das quais no tempo de chuva, estão susceptíveis a incêndios tal é o improviso para a sobrevivência. Eles reclamam pela falta de emprego e pelo humilhante apoio alimentar que a Administração tem levado àquela comunidade. Dizem receber de vez em quando fuba de milho e óleo vegetal em quantidades insuficientes, pois não têm outras alternativas. Palavras como: “há 20 anos que estamos na rua, não queremos ser eternos dependentes, só queremos que legalizem esta zona e distribuam equitativamente um terreno por família. Muitos de nós já têm formação profissional, com o apoio da Igreja e então poderemos construir as nossas próprias casas. Não queremos ter visitas só para verem como nós estamos, queremos sim que nos ajudem a encontrar soluções para a nossa situação. O que seria de nós sem o apoio da associação OMUNGA?”

Enormes dificuldades têm também as mães afectadas por HIV, que vivem no centro acima citado e, como não podem amamentar os seus filhos, afirmam: “por falta de recursos já nos confrontámos com o óbito dos bébés por fome.” A maior parte delas desistem de fazer o tratamento porque justificam :“ os medicamentos são muito fortes e sem comida não dá!”

Longe de querer ensinar o Padre a rezar a missa, apenas como sugestão, termino: Preocupação sim com a reconstrução das infra-estruturas do País, bastante visível, mas preocupação, acima de tudo, com o tecido social e humano.



ÁUREA MACHADO


09/05/2009

QUINTAS DE DEBATE

CONVITE

Há muito que se tem feito para o acreditamento do desenvolvimento das zonas rurais, com investimentos de ponta em vários sectores, em particular no sector da agricultura. Não seria viável conciliar a procura e a oferta, e reforçar o cooperativismo comunitário?
Nessas questões como criar mecanismos que salvaguardem a solidariedade entre o consumidor e o produtor?
A vida em sociedade significa interiorizar aquilo que são os valores fundamentais e pô-los em prática.

QUINTAS DE DEBATE pretende juntar diferentes visões sobre temas da actualidade como política, economia e sociedade. Acompanhe:

No dia 14 de Maio a partir das 15 horas, no SOLAR DOS LEÕES - BENGUELA, será realizado mais um Quintas de Debate, com o tema: CRESCIMENTO ou DESENVOLVIMENTO: Que desenvolvimento rural?

Serão Prelectores: Francisco Eduardo (Engenheiro Agrónomo c/ experiência em desenvolvimento rural) e Cristiano Luís (Presidente do Núcleo Representativo das Associações – Dombe Grande)

Poderão acompanhar ainda a 28 de Maio de 2009:

DEMOCRACIA, ELEIÇÕES E CIDADANIA: O que é necessário para que as eleições signifiquem democracia? O papel da sociedade civil no equilíbrio político.

Será prelectora: Tina Abreu

PARTICIPE E DIVULGUE

João Malavindele Manuel
Coordenador do CID

A OMUNGA agradece a todos os prelectores por se disponibilizarem de forma voluntária a darem as suas contribuições, como ao Pambazuka, Club K e Nova Águia, pela abertura no acompanhamento e divulgação dos debates.
Conta com o apoio da Christian Aid e PROMODES
Poderão ainda acompanhar os debates, acedendo aos textos, comentando, questionando, sugerindo ou criticando através do
http://quintasdedebate.blogspot.com ou ainda www.club-k-angola.com e www.pambazuka.org. Para mais contactos podem aceder ao terminal telefónico +00 244 272221535, ao móvel +00 244 917212135 e aos email quintas.de.debate@gmail.com, omunga.coordenador@gmail.com. omunga.cid@gmail.com