Nesta sexta-feira, 24 de Abril, foi entregue pela Southern
Africa Litigation Center à Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos,
que se encontra reunida na sua 56.ª Sessão ordinária, em Banjul, Gâmbia, uma
carta aberta contra os ataques de xenofobia que se desencolaram na África do
Sul.
A carta que foi subscrita por 130 organizações africanas,
entre as quais a OMUNGA, exige a tomada imediata de medidas que impeçam a
continuidade de tais ataques, como a responsabilização dos seus autores, bem
como as represálias contra cidadão sul africanos em demais países.
Acompanhe aqui a versão na íntegra em português (a mesma também pode ser encontrada em http://www.southernafricalitigationcentre.org/2015/04/23/carta-aberta-a-comissao-africana-sobre-os-ataques-xenofobos-na-africa-do-sul/ ):
Centro de Litigação da África Austral
Carta Aberta à Comissão Africana sobre os ataques
xenófobos na África do Sul
23 de abril de 2015
Caros presidente e
comissários da Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos,
As organizações da sociedade
civil abaixo-assinadas escrevem - como organizações e cidadãos preocupados,
para manifestar a nossa apreensão sobre os ataques xenófobos que estão a
ocorrer na República da África do Sul, sobretudo contra cidadãos de outros
países africanos. Dirigimo--nos a vós, organismo responsável pela promoção e
proteção dos direitos humanos no continente africano, pedindo-vos que instem o governo
sul-africano a dar passos concretos para pôr fim a estes ataques, a julgar os
responsáveis pelos mesmos e a proteger os cidadãos estrangeiros que vivem no
território da África do Sul para que não sofram violações de direitos humanos, e
tenham proteção, incluindo no que respeita ao direito à vida.
Como organizações da
sociedade civil a trabalhar em direitos humanos no continente africano, estamos
especialmente preocupados com a perda de vidas e com as vítimas destes ataques
que ainda assim conseguiram sobreviver, bem como com o impacto sobre a dignidade
dos cidadãos estrangeiros que vivem na África do Sul e os danos causados à
propriedade privada, que constituem uma grave violação dos direitos consagrados
na Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos (Carta Africana). O direito
à vida, o direito a não ser sujeito a tortura nem a tratamento cruel, desumano
e degradante, e o direito a igualdade total perante a lei não são direitos
derrogáveis – não dependem do estatuto que uma pessoa tenha num país. O
estatuto de cidadãos estrangeiros que detêm estas vítimas de ataques na África
do Sul é, por isso, irrelevante.
Assistimos a declarações
feitas por vários governantes, incluindo membros do executivo sul-africano, no
sentido de ser dada assistência a pessoas que estão a sair do país. Muito
embora deva ser dada assistência àqueles que desejam partir, a solução para a
violência não pode ser a repatriação de todos os cidadãos estrangeiros, mas antes
assegurar que no país os seus direitos sejam protegidos. Além disso, os atos de
quem leva a cabo ataques contra cidadãos estrangeiros não podem ser
recompensados com a prestação de assistência, para que sejam atingidos os seus
objetivos de fazer partir do país os cidadãos que não sul-africanos. Neste
aspeto, lembramos todos os Estados do que está estabelecido no artigo 21 da
Carta Africana, que proíbe expressamente as expulsões maciças de cidadãos
estrangeiros, incluindo expulsões em larga escala dirigidas a grupos de
determinada nacionalidade.
Estamos ainda preocupados com
declarações feitas por entidades em posição de autoridade e influência, que
podem configurar um incitamento à violência, e com o impacto que isso pode
ter na perpetuação da xenofobia. Apesar
de algumas declarações terem sido feitas para condenar a violência,
preocupa-nos que não estejam a ser dados passos concretos suficientes para
prevenir novos ataques, para julgar os responsáveis por esses ataques, para
proteger os cidadãos estrangeiros e para evitar o êxodo do país de cidadãos
estrangeiros em larga escala e sob coação.
As organizações
abaixo-assinadas pedem à Comissão Africana que inste o governo da África do Sul
a:
·
Proteger os
cidadãos estrangeiros de novos ataques, através nomeadamente de um aumento da
presença policial nas áreas de elevado risco, e a pôr imediatamente em marcha
iniciativas de resolução de conflito nessas áreas, envolvendo o Ministério dos
Assuntos Internos;
·
Providenciar
assistência humanitária urgente aos cidadãos estrangeiros deslocados no país,
incluindo aconselhamento em situações traumáticas;
·
Levar à justiça
os responsáveis pela violência contra cidadãos estrangeiros. Para facilitar
estes processos, o Ministério da Justiça deverá formar tribunais especiais, tal
como foi feito durante o Campeonato do Mundo de Futebol de 2010 na África do
Sul, para tratar os casos de violência contra cidadãos estrangeiros, com o
propósito de aliviar a carga sobre os tribunais comuns. Toda a informação
relativa ao acesso a estes tribunais especiais deverá ser largamente difundida;
·
Investigar e
julgar os instigadores deste potencial ciclo perpetuador da violência;
·
Condenar de forma
inequívoca declarações feitas por pessoas em posições de autoridade e
influência que possam constituir um incitamento à violência;
·
Envolver de forma
efetiva e o mais amplamente possível a opinião pública sul-africana, com vista
à contenção e à erradicação da xenofobia e da violência xenófoba. Estas
mensagens devem ser repetidas, constantemente reiteradas e ouvidas não apenas
após os momentos de crise. Estas mensagens devem estar acessíveis a todos, em
todos os dialetos locais, e devem ser comunicadas diretamente às comunidades e
envolver os líderes locais.
Em 2008, ataques xenófobos
causaram a morte a 62 pessoas e centenas ficaram feridas, tendo-se gerado um
fluxo de 100.000 deslocados ou mais. Na
sequência desses ataques, a Comissão de Direitos Humanos da África do Sul
apresentou um relatório[i]
com as suas conclusões e recomendações. Pedimos-vos igualmente que recordem
este documento ao governo sul-africano e que o urjam a concretizar
imediatamente as recomendações que dele constam.
Além disso, pedimos-vos que
instem os governos de outros países a garantirem que são dados os passos
necessários para evitar represálias contra cidadãos sul-africanos nos seus
territórios. As organizações internacionais devem também colaborar nos esforços
de assistência humanitária dirigida aos cidadãos estrangeiros deslocados na
África do Sul e àqueles que regressam aos seus países de origem na sequência
dos ataques.
Submetida pelo Centro de
Litigação da África Austral
Kaajal Ramjathan-Keogh,
Diretor-executivo
Assinada pelas seguintes organizações da sociedade civil,
sediadas e que trabalham em assuntos de direitos humanos no continente
africano:
1.
Advogados pelos
Direitos Humanos (LHR - África do Sul)
2.
Associação de
Advogados da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC LA)
3.
Centro de
Recursos Legais (LRC), África do Sul
4.
Fórum das ONG do
Zimbabwe para os Direitos Humanos, Zimbabwe
5.
Instituto de Comunicação Social da África
Austral (MISA)
6.
Centro de Assistência
Legal (LAC), Namíbia
7.
Centro de
Investigação e Documentação de Defensores das Mulheres (WARDC), Nigéria
8.
Assistência Legal
em África (AFLA)
9.
Coligação para o
Tribunal Penal Internacional (CICC)
10.
Comissão
Internacional de Juristas (ICJ – Quénia)
11.
Centro dos
Direitos Humanos e Reabilitação (CHRR), Malawi
12.
Centro para o
Desenvolvimento dos Povos (CEDEP), Malawi
13.
Centro de
Responsabilidade e Estado de Direito (CARL), Serra Leoa
14.
Fundação dos
Média da África Ocidental (MFWA)
15.
Associação para a
Educação das Crianças (CHESO), Tanzânia
16. Coligação da Costa do Marfim para o Tribunal Penal
Internacional (CI-CPI), Costa do Marfim
17.
Rede Equitas na
Costa do Marfim (REQCI), Costa do Marfim
18.
Grupo de Trabalho
para os Instrumentos Internacionais (GT2I)
19.
Iniciativa
Internacional a favor dos Direitos dos Refugiados (IRRI)
20.
Fundação para as
Iniciativas de Direitos Humanos (FHRI), Uganda
21.
Instituto de
Estudos em Segurança (ISS)
22.
Associação
“Direitos Humanos Primeiro” do Ruanda (HRFRA), Ruanda
23.
Centro Scalabrini
da Cidade do Cabo, África do Sul
24.
Centro da África
Austral para a Resolução Construtiva de Conflitos (SACCORD), Zâmbia
25.
Iniciativa para
as Liberdades Civis (ICL), Zâmbia
26.
Consórcio para os
Refugiados e Migrantes na África do Sul (CoRMSA), África do Sul
27.
Centro de Justiça
e Promoção dos Direitos (ERCJ), Zâmbia
28.
Rede Queniana
para os Assuntos Legais e Éticos sobre o VIH/Sida (KELIN), Quénia
29.
Rede de Saúde da
Mulher da Namíbia (NWHN), Namíbia
30.
Centro de
Aconselhamento, Assistência e Educação em Direitos Humanos (CHREAA), Malawi
31.
Aliança para o
VIH/Sida e Direitos da África Austral (ARASA)
32.
Associação
TransBantu da Zâmbia (TBZ), Zâmbia
33.
Associação do
Zimbabwe para a Prevenção do Crime e Reabilitação do Ofensor (ZACRO)
34.
Mulher e Lei na
África Austral (WLSA-Moçambique), Moçambique
35.
Mulher e Lei na
África Austral (WLSA-Zimbabwe), Zimbabwe
36.
Centro de
Proteção Legal Tshwaranang (TLAC), África do Sul
37. Centro para Raparigas e Interação (CEGI), Malawi
38. Associação Justiça, Paz e Democracia (AJPD), Angola
39.
Coligação
Pan-africana Positiva da Mulher-Zimbabwe
40.
Coligação
Pan-africana Positiva da Mulher-África Austral e Ilhas do Oceano Índico
41.
Centro de Estudos
Legais Aplicados (CALS), África do Sul
42.
Fórum dos
Advogados de Direitos Humanos (LFHR), Malawi
43.
Coligação para a
Prevenção do Aborto Inseguro (COPUA), Malawi
44.
Escada para o
Desenvolvimento Rural (LAFORD), Malawi
45. Associação das Organizações de Direitos Humanos (AHURIO),
Uganda
46. Centro para os Direitos Sexuais (SRC), Zimbabwe
47. Associação de Reintegração dos Jovens/Crianças na Vida
Social (SCARJoV), Angola
48. Associação, Mulher, Lei e Desenvolvimento (MULEIDE),
Moçambique
49.
Grupo Matrix Support, Lesoto
50.
Iniciativa
Africana para o Desenvolvimento e para a Paz (ADPI)
51.
Instituto de
Serviços de Apoio Paralegal (PASI), Malawi
52.
Fundação contra a
Sida da África do Sul (AFSA), África do Sul
53.
Rede do Botswana sobre
a Ética, a Lei e o VIH/Sida (BONELA), Botswana
54.
Campanha para o
Tratamento, Defesa e Literacia (TALC), Zâmbia
55.
Serviço de
Informação sobre o VIH/Sida da África Austral (SAfAIDS)
56.
Centro de
Direitos Humanos da Universidade de Pretória (CHR), África do Sul
57.
Comunidade Temba
de Serviços de Desenvolvimento, África do Sul
58.
Omunga, Angola
59.
Rede de Apoio
Legal no VIH/Sida (ALN), África do Sul
60.
Iniciativas das
Comunidades para o Avanço Social Holístico (CHISA), Malawi
61.
Proteção das
Crianças com Sida (PES), República Democrática do Congo
62.
Ndifuna Ukwazi
(NU), África do Sul
63.
Rede do Malawi de
Líderes Religiosos Vivendo ou Afetados pelo VIH/Sida (MANERELA+), Malawi
64.
Fundação de
Recursos legais, Zâmbia
65.
ENDA Santé
66.
Instituto Panos
da África Austral
67.
Projeto para a
Responsabilização e Direitos Socioeconómicos (SERAP), Nigéria
68.
Grupo de Ação
Mulheres do Darfur (DWAG), Sudão
69.
Centro de
Documentação e Desenvolvimento dos Recursos Civis (CIRDDOC), Nigéria
70.
Iniciativa Ação
Afirmativa para a Mulher (NCAA), Nigéria
71.
Coligação das NGO
da África Oriental (CENGOS), Nigéria
72.
Coligação
Nigeriana para o Tribunal Penal Internacional (NCICC), Nigéria
73.
Projeto de Defesa
e Assistência Legal (LEDAP), Nigéria
74.
Juventude para a
Criança em Cristo (YOCIC), Zimbabwe
75.
Fundo Susceptible
Iyanai Chinoda OVC (SICO), Zimbabwe
76.
Centro para o
Estudo da Violência e Reconciliação (CSVR), África do Sul
77. Rede Moçambicana de Líderes Religiosos Vivendo com VIH/Sida
(MONERELA+), Moçambique
78.
Associação
Africana de Defesa dos Direitos Humanos (ASADHO)
79.
Iniciativa para
os Direitos Sociais e Económicos (ISER), Uganda
80.
Aliança
Internacional dos Recursos Naturais de África (IANRA)
81.
Desenvolvimento
Internacional e Ambiente em África no Século XXI (AIDE21)
82.
FEMNET-Rede das
Mulheres Africanas para o Desenvolvimento e as Comunicações
83.
Programa Ambiental
das Mulheres na Nigéria (WEP-Nigéria)
84.
Movimento das
Mulheres do Delta do Níger para a Paz e o Desenvolvimento (NDWPD), Nigéria
85.
Geração-Positiva,
Camarões
86.
Rede das
Organizações da Sociedade Civil (CSO Network-Quénia)
87.
NamRights Inc, Namíbia
88.
Coletivo Senegalês
dos Africanos para a Promoção da Educação para o Ambiente (COSAPERE), Senegal
89.
Centro para a
Saúde, Direitos Humanos e Desenvolvimento (CEHURD), Uganda
90.
Comité Consultivo
para os Direitos Humanos (HRCC), Malawi
91.
Centro para o
Empoderamento da Juventude e Educação Cívica (CYECE), Malawi
92.
Juventude e Sociedade (YAS), Malawi
93.
Rede de Redução
da Pobreza (PORENET), Moçambique
94.
Grupo de Apoio Khulumani,
África do Sul
95.
Homens Africanos
para os Direitos e a Saúde Sexual (AMSHeR)
96.
Sociedade para o
Desenvolvimento Internacional (SID)
97.
Prevenção,
Informação e Luta contra a Sida (PILS), Maurícia
98.
Quenianos pela
Paz com Verdade e Justiça (KPTJ), Quénia
99.
Amnistia
Internacional Senegal (AI Senegal)
100. Section
27, África do Sul
101.
Centro de Apoio
às Mulheres Masimanyane, África do Sul
102.
Rede Gay &
Lesbian, África do Sul
103.
Amnistia Internacional
Mali (AI Mali)
104. Equality
Now, Quénia
105. Corruption
Watch, África do Sul
106.
Centro de Defesa
e Apoio Paralegal dos Direitos da Criança (CRAPAC), Malawi
107.
Centro Africano
de Estudos para a Justiça e para a Paz (ACJPS)
108.
Advogados do Zimbabwe
para os Direitos Humanos (ZLHR), Zimbabwe
109.
Agenda Diretos
dos Média (MRA), Nigéria
110. National
Right to Food, Malawi
111.
Rede do Malawi
para a Justiça Económica (MEJN), Malawi
112.
Equidade na Saúde
no Malawi (MHEN), Malawi
113.
Rede do Malawi de
Pessoas Vivendo com VIH/Sida (MANET+), Malawi
114.
Programas Igreja
e Sociedade-CCAP Sínodo de Livingstonia, Nkhoma, Blantyre, Zâmbia e Harare
115.
Plataforma Espaço
Civil e Político (CSP Platform), Malawi
116.
Centro para a
Governança e Participação Pública (CeGPP), Malawi
117.
Instituto para a
Interação Política (IPI), Malawi
118. Fundação
Ukhondo, Malawi
119.
Alternativa de
Desenvolvimento e Proteção dos Direitos das Mulheres (WRAPA), Nigéria
120.
Coligação
Educação da Sociedade Civil (CSEC), Malawi
121.
Centro para os
Assuntos da Juventude e das Crianças (CEYCA), Malawi
122.
Development Dynamics Nigeria, Nigéria
123.
Comissão
Internacional de Juristas (ICJ-Programa África)
124.
Sindicato
Pan-africano de Advogados (PALU)
125.
Rede de Direitos
Humanos do Uganda (HURINET-U), Uganda
126.
Advogados da
Suazilândia para os Direitos Humanos (SLHR), Suazilândia
127.
Iniciativa Open
Society para a África do Sul (OSISA)
128.
Instituto de
Direitos Humanos da África do Sul (HURISA), África do Sul
[i] Relatório da SAHRC: Investigation into Issues of Rule of Law, Justice and Impunity arising out
of the 2008 Public Violence against Non-Nationals, http://www.sahrc.org.za/home/21/files/Reports/Non%20Nationals%20Attacks%20Report_1-50_2008.pdf
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