12/08/2009

DEMOLIÇÕES E DESALOJAMENTOS FORÇADOS

Texto publicado no Semanário ANGOLENSE, na sua edição 328, ANO VII de 08 de Agosto de 2009
Gostaria de começar esta reflexão, sobre o que devemos entender por Desalojamentos Forçados. De acordo à Observação Geral N.º 7: Direito a uma Habitação Adequada, das Nações Unidas, entende-se por “desalojamentos forçados” como sendo “o facto de fazer sair pessoas, famílias e/ou comunidades das suas casas e/ou das terras que ocupam, de forma permanente ou provisional, sem oferecer-lhes meios apropriados de protecção legal ou de outra índole nem permitir-lhes o acesso a eles”.[1]

De qualquer das formas e ainda de acordo ao mesmo documento, o referido Comité chegou à conclusão que “os desalojamentos forçados são prima facie incompatíveis com os requisitos do Pacto” (Pacto Internacional dos Direitos Económicos, Sociais e Culturais).

O que se pretende com a presente reflexão é trazer a público as posições do sistema de direitos humanos das Nações Unidas sobre o assunto. Na realidade a questão de demolições e desalojamento forçado é grave e a comunidade internacional desde há algum tempo que tem vindo a abordar tal questão. É assim que em 1976, a Conferência das Nações Unidas sobre os Assentamentos Humanos, definiu que só se deveriam “iniciar operações importantes de evacuação quando as medidas de conservação e de reabilitação não são viáveis e se adoptem medidas de recolocação[2]

Ainda de acordo ao mesmo documento, em 1988, na Estratégia Mundial de Habitação até o Ano 2000, aprovada pela Assembleia Geral na sua resolução 43/181, reconheceu-se a “obrigação fundamental [dos governos] de proteger e melhorar as casas e os bairros em lugar de prejudicá-los ou destruí-los”. Pode-se ler ainda que, no Programa 21, declarava-se que “dever-se-ia proteger legalmente a população contra o desalojamento injusto das suas casas ou suas terras”. Mais adiante, tal documento relembra que no Programa do Habitat, os governos se comprometeram a "proteger a todas as pessoas contra os desalojamentos forçados que sejam contrários à lei, tomando em consideração os direitos humanos, e garantir protecção e reparação judicial nesses casos”. A própria Comissão de Direitos Humanos tinha assinalado que “a prática dos desalojamentos forçados constitui uma violação grave dos direitos humanos”.[3]

Atendendo à interrelação e interdependência que existe entre todos os direitos, os desalojamentos forçados violam frequentemente outros direitos humanos. Além de infringir claramente os direitos consagrados no Pacto Internacional dos Direitos Económicos, Sociais e Culturais, “a prática dos desalojamentos forçados também pode dar lugar a violações de direitos civis e políticos, tais como o direito à vida, o direito à segurança pessoal, o direito à não ingerência na vida privada, à família e o lar, e o direito de desfrutar em paz os bens próprios”.[4]

De acordo ainda à Observação Geral N.º 7, “o próprio Estado deve abster-se de levar a cabo desalojamentos forçados e garantir que se aplique a lei a seus agentes ou a terceiros que efectuem desalojamentos forçados”. De acordo ao Comité, este pressuposto vê-se reforçado também pelo disposto no parágrafo 1 do artigo 17 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, que complementa o direito a não ser desalojado forçadamente sem uma protecção adequada.

Antes de que se leve a cabo qualquer desalojamento forçado, em particular os que afectam a grandes grupos de pessoas, “os Estados Partes deveriam velar por que se estudem em consulta com os interessados todas as demais possibilidades que permitam evitar ou, pelo menos, minimizar a necessidade de recorrer à força”.[5]

Por último, gostaríamos de lembrar que aquando da revisão de Angola, em Novembro de 2008, pelo Comité dos Direitos Económicos, Sociais e Culturais, foi recomendado que Angola deve:

a) adoptar medidas firmes para conseguir que só se recorra a desalojamentos em última instância e adoptar leis e directivas que definam rigorosamente as circunstâncias e condições para levar a cabo um desalojamento em conformidade com a Observação Geral n.º 7 do Comité sobre o Direito a uma Habitação Adequada (art. 11.1) e os desalojamentos forçados (1997);
b) investigar todas as alegações do uso excessivo da força por parte dos funcionários da polícia e do Estado que participam nos desalojamentos forçados e pôr os autores à disposição da justiça;
c) velar para que se ofereça a todas as vítimas dos desalojamentos forçados uma alternativa de Habitação Adequada ou indemnização e para que as vítimas tenham acesso a recursos jurídicos eficazes;
d) garantir que todos os desalojamentos forçados que sejam levados a cabo no contexto da Copa Africana das Nações, um evento desportivo que se celebrará em 2010, cumpram com os requisitos e as directrizes da Observação Geral N.º 7
.[6]

Apenas devemos perguntar. O Governo de Angola está a observar o seu compromisso perante os Pactos Internacionais de Direitos Humanos e as suas recomendações?

José Patrocínio
Lobito
04 de Agosto de 2009

[1] Observación General N.º 7: El derecho a una vivienda adequada (párrafo 1 del articulo 1)
[2] Observación General N.º 7: El derecho a una vivienda adequada (párrafo 1 del articulo 1)
[3] Observación General N.º 7: El derecho a una vivienda adequada (párrafo 1 del articulo 1)
[4] Observación General N.º 7: El derecho a una vivienda adequada (párrafo 1 del articulo 1)
[5] Observación General N.º 7: El derecho a una vivienda adequada (párrafo 1 del articulo 1)
[6] Tradução não oficial do documento E/C.12/AGO/CO/3 de 1.º de Dezembro de 2008

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