27/08/2009

QUINTAS DE DEBATE: A INFORMAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO HUMANO

Apresentação do Embaixador José Gama* do Club-K no QUINTAS DE DEBATES realizado pela OMUNGA, aos 27 de Agosto de 2009 em Benguela

Introdução

É a primeira vez que venho ao Lobito. Ontém o coordenador da OMUNGA, Sr José Patrocínio levou-me a conhecer parte da restinga. Estávamos num restaurante e nas nossas abordagens falámos de Nelson Mandela. Contei-lhe que há dois anos atrás o Mandela fez anos e sempre que ele faz anos a sua fundação convida sempre uma individualidade de prestigio internacional para se juntar. E neste dia convidaram o Kofi Anan. Estava na sala o actual presidente sul africano Jacob Zuma e outros dirigentes do Governo e do ANC. Uma cerimónia com Mandela ninguém falta porque todos querem vê-lo. Ao entrar notámos que estava já muito cansado mas mesmo assim tinha tempo para a sua causa dos direitos humanos. Quando lhe foi dada a palavra e com o seu ar alegórico disse o seguinte: “Vocês não vieram aqui para ver como se parece um velho de 89 anos mas para ouvir o que tenho para dizer” .

O que ele queria dizer é que o mais importante num debate é a mensagem e não as pessoas. Uma mensagem é uma informação. E é exatamente o tema que iremos abordar a importância da informação e o impacto no nosso desenvolvimento humano.

Definição de informação

A informação é saber dos seus direitos na sociedade. A própria Declaração Universal de Direitos Humanos diz, no Artigo19, que “todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e de expressão; esse direito inclui a liberdade de ter opiniões sem sofrer interferência e de procurar, receber e divulgar informações e idéias por quaisquer meios, independentemente de fronteiras”.

Em Abril deste ano o Embaixador João Garcia da Comissão Europeia visitou o centro “16 de Junho” no bairro da lixeira aqui no Lobito e os jovens que vivem nas tendas escreveram uma carta fazendo discrição da sua situação e dentre os assuntos que eles faziam referência sobre promessas não cumpridas pela administração municipal nas quais eu passo a citar:

· Construção de casas para todos dentro de seis meses.
· Arranjar emprego para todos nas seguintes empresas (CFB, Refinaria, Odebrestch e Secil Lobito).
· Dinheiro para as mulheres fazerem negócios.
· Formação profissional a todos.
· Máquina de fabricar blocos.
· Dar sempre comida e água.
· Meter todos a estudar nas escolas públicas.
· Registrar todos.

O facto destes jovem aproveitarem a ocasião do Embaixador da Comissão Europeia para cobrar os seus direitos ou o que lhes foi prometido isto implica dizer que são jovens que têm informação sobre os seus direitos. Informação é isso.

Importância da informação nos processos democráticos

Não pode haver democracia sem informação. Nos processos democráticos a informação tem a Valência de um instrumento para cultivo do nosso intelecto. De entendermos o que vai ao nosso redor e aprendermos a fazer leitura dos fenômenos.

Consequência da falta de informação nos órgãos judiciais

Não pode haver uma democracia sem justiça social e para haver justiça social todos nós devemos estar instruídos sobre os nossos direitos jurídicos. A falta do conhecimento disto tem levado tanto o cidadão como os próprios agentes de justiças a cometerem erros que atentam contra os valores da nossa democracia.

Há um jovem rapper em Cabinda que conhecido por Mc Dogmilson que trabalha num cyber café. Através da internet fez uma rede de amizades com rapperes brasileiros. Em Agosto do ano passado estes amigos enviaram-lhe alguns discos e ao andar na rua com os mesmos foi interceptado por um polícia que o prendeu por ele não ter podido provar que os discos não eram para fins piratas. Prenderam-no. Ficou preso cerca de dois meses acabando por ser liberto na manhã do dia 25 de Outubro. Assim que saiu estava preocupado em procurar o agente que lhe facilitou a saída para dar alguma gasosa. Ele acreditava que se estava livre era porque a polícia fez lhe um favor em devolve-lo a liberdade.

Este exemplo mostra como a nossa população é prejudicada pelos órgãos de justiça por desconhecerem os seus direitos fundamentais.

Rigorosidade da informação nos serviços de segurança

Certa vez estava com um mais velho que foi responsável dos serviços de informação de um país africano e dizia-me que na avaliação de uma informação todo detalhe por mais pequeno que seja nunca deve ser ignorado e deu-me um exemplo. Contou-me que há uns anos os russos estavam a treinar alguém por 15 anos para um dia vir a chefiar o Estado de Israel mas tinham falhado num pequeno detalhe. Este indivíduo que estava a ser treinado, chegou a ascender nas estruturas partidárias ou seja tinha meio caminho andando mas um dia caiu doente. Levaram-no ao hospital, foram feitas várias análises e não conseguiam ver o que o homem tinha. Análises mais análises e a dada altura o homem tinha de ficar nú e notaram que o homem não era circuncizado.

Na cultura dos Judeus, as crianças são circuncizadas no oitavo dia de nascimento. Este pequeno detalhe pôs a baixo o plano que os russos preparavam

O mesmo aconteceu connosco aqui em Angola. A semana passada foi liberto um jornalista em Cabinda que tinha sido julgado ano passado e condenado a 12 anos de cadeia por ter alegadamente atentado contra a Segurança do Estado. No julgamento não foi provado que ele tivesse dado apoio logístico à guerrilha de Cabinda, em dinheiro (500 usd) e nem ficou provado que o mesmo tivesse uma existência dupla. Os co réus não confirmaram conhecer o jornalista com quem alegadamente teriam cometido o mesmo delito. Um deles ainda preso chegou apanhar um tiro na barriga quando era forçado a depôr contra o jornalista.

Estávamos diante de um erro dos serviços de segurança e mostrou como as autoridades judiciais falharam por não terem sido rigorosos ao analisarem as informações. A HRW publicou um relatório com base em investigações e aconselhou as autoridades a domesticarem os agentes dos serviços de informação/segurança.

Consequência da partidarização da informação nas eleições

Começaria por perguntar até que ponto a comunicação social nas nossas eleições foram partidarizadas?

Em Fevereiro circulou um memorando de uma associação dos profissionais de Benguela datado de 25 de Fevereiro endereçado ao Comitê Provincial do MPLA. E nesta carta (transcrevo aqui na integra) “queremos recordar a direcção do partido o importante papel que os jornalistas desempenharam nas eleições legislativas que culminou com a vitória do MPLA.”

O grupo de jornalistas dizia que não viu recompensados os seus esforços. Segundo eles: “Para sermos mais claros, nem que não fossem todos, mas gostaríamos que alguns membros da classe fossem agraciados com viaturas e alguns valores que pudessem ajudar em projectos pessoais.”

O memorando dos jornalistas foi muito grave. Foi uma prova viva que os jornalistas nas eleições tomaram partido, ao invés de servirem o povo informando com imparcialidade. Aqueles que deveriam difundir o estado de direito na qualidade de jornalistas acabaram por ter comportamento na linha do partido único. Isto atemoriza e confunde o povo que fica sem compreender exactamente em que situação é que nós estamos

E de que forma ficamos face a este comportamento da rede dos jornalistas? A União Europeia e o mundo não reconheceram as nossas eleições como livres e justas. Porque de acordo com às normas internacionais as eleições para serem livres e justas reúnem certos requisitos que são:

a) Periódicas
b) Competitivas
c) Voto secreto e tolerância
d) Direito de informação equilibrada


Conclusão e sugestão:

1- O Trabalho da comunicação social foi um atentado à democracia. Chegamos à conclusão que a credibilidade das eleições de Setembro foi prejudicada por causa da parcialidade e partidarização dos órgãos de comunicação públicos levando o processo a desobedecer aos requisitos necessários para serem consideradas internacionalmente como livres e justas. A União Europeia e outros optaram por qualificar apenas por “pacíficas”.

O Jornalista numa democracia deve saber servir o povo. Não pode ser um “Yes man” do partido. Tem que ter também a coragem de dizer “não”. E como dizia, o falecido Jonas Savimbi: “O Sim só tem valor quando é dito por aqueles que também podem dizer NÃO”

2 - Concluímos que a falta de rigorosidade nas investigações feitas pelos órgãos investigação tem levado as pessoas a serem alvos dos erros de informação dos órgãos de justiça. Aconselhamos a serem mais rigorosos nas investigações e a terem sempre em conta aos mais pequenos detalhes de elementos de informação nas suas investigações.

3- Concluímos que a falta ou ausência de informação torna os populares alheios aos seus direitos mas por outro lado observamos que os jovens do centro “16 de Junho” passaram a ter informação sobre aquilo que são os seus direitos de cidadão e das responsabilidades das instituições do estado para com eles.

Os jovens como o nosso irmão Frederico e o Amaral que são lideres destas comunidades devem manter sempre informados os outros jovens com os seus conhecimentos. Ao crescermos informados, é o município que cresce, é a província que ascende e o país que engrandece. Assim poderemos um dia também repetirmos o que disse um dia Martin Luther King “Nós não somos o que gostaríamos de ser. Nós não somos o que ainda iremos ser. Mas, graças a Deus, Não somos mais quem nós éramos”

Recomendação:

Extinção do Ministério da comunicação social criando uma alto autoridade que regula estes órgãos onde os seus responsáveis passariam a ser eleitos como acontece em outros países onde os juízes e reitores de universidades são eleitos

Obrigado


*José Gama

Activista Cívico, é o Secretário Geral do Club dos Angolanos no Exterior e seu Embaixador em Pretória. Analista político do Jornal Angolense e da TV Sul Africana SABC.

Licenciado em Engenharia Geofísica pela University of South Pretoria (2003-2006) e em Relações Internacionais e Diplomacia, pela University of South Africa.

Sem comentários: