Luanda, 27 de
Julho de 2015.
C/c: Relator Especial para os
Defensores de Direitos Humanos da Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos
Povos - BANJUL
Ministro da Justiça e dos Direitos
Humanos - LUANDA
Procurador-geral da República - LUANDA
Provedor da Justiça - LUANDA
Ministro da Informação - LUANDA
Sindicato dos Jornalistas Angolanos -
LUANDA
Director da penitenciária de Calomboloca
- ICOLO E BENGO
Comandante Municipal da Polícia de Icolo
e Bengo - ICOLO E BENGO
Ao
Exmo. Sr. Ministro do
Interior
Att: Ângelo de Veiga Tavares
L U A N D A
CARTA ABERTA
"ESCLARECIMENTOS SOBRE DETENÇÃO E TRATAMENTO INJUSTO DE ACTIVISTAS E
JORNALISTA NA PENITENCIÁRIA DE CALOMBOLOCA "
Cordiais saudações.
A OMUNGA, Associação Angolana
de Promoção e Protecção de Direitos Humanos e com o Estatuto de Observador da
Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, e a SOS Habitat vêm através
desta, expor e solicitar o seguinte.
No dia 22 de Julho do
corrente ano, os activistas e membros da OMUNGA João Malavindele e Jesse
Lufendo, acompanhados pelo responsável da SOS Habitat
Rafael Morais e o seu motorista Pedro Narciso e pelo jornalista Nelson Sul
D'Angola deslocaram-se à penitenciária de Calomboloca com o objectivo de
visitarem os jovens aí detidos dentro do caso dos 16 cidadãos detidos em Luanda
desde 20 de Junho de 2015 sob a acusação de tentativa de golpe de Estado.
O objectivo da visita, para
além dos relacionamentos pessoais que existem entre os membros da equipe e os
jovens detidos, era o de avaliar as condições de detenção e de transmitir
solidariedade.
Lembramos que a OMUNGA e a
SOS Habitat têm vindo publicamente a denunciar essas detenções considerando-as
como injustas e descabidas, conjuntamente com toda a rede de solidariedade
nacional e internacional pela libertação imediata e incondicional de todos os
presos políticos.
De acordo às informações
obtida no Guiché da Penitenciaria, o impedimento foi justificado pelo facto dos
detidos só poderem receber visitas de familiares directos (pais, esposas e
irmãos).
Posteriormente, e na base de
uma revista à viatura, encontraram o cartão de memória da máquina fotográfica
na mochila do jornalista Nelson Sul D'Angola onde foi encontradas fotografias
de que o mesmo presumivelmente a 50 metros tenha tirado naquele dia onde é
visível o edifício da penitenciária, no seu lado frontal.
Em sequência disso, todos os
membros da equipa foram retidos imediatamente sob ameaça de quererem fazer
política dentro da unidade penitencial. Foram ainda revistados de forma
humilhante sendo obrigados a se despirem completamente. Foram interrogados e
foram-lhes tiradas fotografias para além das cópias dos Bilhetes de Identidades
pessoais. Recordamos ainda que foram apreendidos os 8 telefones dos membros da
equipa, dois computadores portáteis, uma máquina fotográfica e o cartão de
memória, um caça palavras Amarante, um microfone, uma pasta de equipamento, um
auscultador, uma pasta de computador, uma esferográfica e duzentos dólares em
notas de 50 pertencentes a Jesse Lufendo. Posteriormente foi devolvida a
viatura e apenas 100 dólares.
A detenção ocorreu por volta
das 13 horas e os mesmos permaneceram naquele local até por volta das 20 horas,
altura em que foram levados para o comando municipal da polícia de Icolo e
Bengo onde foram ouvidos pelo 2º comandante municipal que lhe garantiu que
voltassem no dia seguinte pelas 12 horas, para reaverem os seus haveres.
A 23 de Julho, os activistas
e o jornalista tiveram contacto com o responsável pelos serviços de
investigação criminal de Icolo e Bengo, que disse chamar-se Sozinho, para o
levantamento dos meios aí retidos. O mesmo garantiu que apenas naquele momento
estava a ter contacto com o caso que mostrou os meios retidos de onde faltavam
100 dólares e a esferográfica. O mesmo mandou aguardar para a emissão dos
termos de entrega e ao fim de algum tempo informou ter encaminhado processo sem
esclarecer concretamente a quem e onde, e mandou a equipe regressar
as 9 horas no dia seguinte .
Já a 24 de Julho, todos os
membros da equipa voltaram à investigação criminal de Icolo e Bengo afim de
poderem reaver os seus meios injustamente apreendidos e foram surpreendidos com
o facto do mesmo responsável da investigação não se encontrar e não ter deixado
nenhuma outra informação nem os bens. Daí a equipa deslocou-se à
Procuradoria-geral de Icolo e Bengo para saber se havia lá algum processo relacionado
com o caso sem êxito uma vez que o procurador não se encontrava também e não
havia qualquer informação.
Insatisfeitos, regressaram ao
comando municipal de Icolo e Bengo onde intencionavam apresentar queixa contra
a penitenciária de Calomboloca e contra a investigação criminal mas foi-lhes
impedido o exercício de tal intenção e foram forçados a abandonar as
instalações do comando municipal e
permaneceram assim à espera a cerca de 100 metros do local. Contactaram o 2º
comandante municipal de Icolo e Bengo, Manuel Francisco, que na presença dos
activistas e do jornalista contactou telefonicamente com o responsável da
investigação criminal e garantiu que o
mesmo estaria reunido.
De acordo ao transcrito,
vemo-nos confrontados com procedimentos injustificados pelo pessoal da
penitenciária contra a dignidade de defensores de Direitos Humanos e
jornalista.
Por outro lado, preocupa-nos
o facto dos pertences continuarem retidos o que viola o direito à propriedade e
privacidade e, a falta de informação sobre o que está a acontecer.
Nesta conformidade, a OMUNGA
e a SOS Habitat solicitam ao Exmo. Sr. Ministro os devidos esclarecimentos
sobre o assunto e a tomada de medidas disciplinares. Exige ainda a devolução
imediata de todos os bens apreendidos. Aproveitamos lembrar que de acordo à
Constituição, no seu artigo 67º, n.º 4 "os arguidos presos têm direito de
receber visitas do seu advogado, de familiares, amigos e assistente religioso e
de com eles se corresponder.,,"
De acordo a notícias postas a
circular, dão conta que 4 dos detidos na cadeia da Caquila, iniciaram uma greve
de fome, nomeadamente Mbanza Hanza, Nuno Dala, Osvaldo Caholo e Nicola Radical e
que "iniciaram o protesto em reacção a restrições impostas pela direcção da
cadeia, que limitou a visita apenas aos pais, conjugues e filhos dos
detidos".[1]
Informa ainda que estas
associações pretendem realizar a referida visita no âmbito do já aqui acima
exposto. Para efeito irá dirigir uma carta ao director da penitenciária do
Calomboloca com esse propósito.
Por outro lado solicita do
Ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, tomando em conta o respeito pela
Constituição, legislação ordinária, tratados internacionais e as recentes
recomendações feitas a Angola quer no âmbito da Comissão Africana dos Direitos
Humanos e dos Povos e dentro do Processo de Revisão Periódica Universal do
Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, que fiscalize tais actos.
Que a Procuradoria-geral da
República, na base do aqui descrito, abra um processo de investigação e
responsabilização considerando o vosso mandato. Lembramos que já a AJPD, a 24
de Julho endereçou uma carta demonstrado a preocupação do impedimento
encontrado em todos os estabelecimentos prisionais onde se encontram os cidadão
detidos dentro do mesmo processo, alegando ordens superiores para apenas
permitirem visitas aos mesmos por familiares directos. Segundo a AJPD, o Sr.
Procurador terá respondido, num ofício datado de 16 de Julho de 2015, que, e
transcrevemos "(,,,) qualquer detido, salvaguardados os casos disciplinares previstos
na Lei Penitenciária, têm direito de receber visitas, desde que o queira. Deste
modo, não foram colocadas restrições aos 15 detidos, em matéria de Direitos
consagrados na Constituição".
Solicitamos ao Sr. Provedor
de Justiça que acompanhe este processo e dê as devidas orientações no sentido
de se respeitar a legalidade.
Havendo flagrantemente uma
violação à lei de imprensa, limitando o trabalho de um jornalista que, por
apenas ter registado algumas fotos onde aparece a parte exterior da referida
penitenciária, continua detido todo o seu equipamento, solicitamos ao Sr.
Ministro da Informação que preste os devidos esclarecimentos e intervenha para
que se respeite o plasmado na lei.
Pretendemos também, que o
Sindicato de Jornalistas Angolanos, enquanto o representante legítimo da classe
jornalista que interceda e tome as medidas necessárias no acompanhamento deste
caso.
Apela ainda à Comissão
Africana que tome medidas urgentes junto do Estado angolano para que respeite
definitivamente o papel e trabalho dos defensores de Direitos Humanos e de
jornalistas.
Sem qualquer outro assunto de
momento, queiram aceitar as nossas cordiais saudações.
José Patrocínio
Coordenador da OMUNGA
Rafael Morais
Coordenador da SOS Habitat
[1] Rede Angola,
Quatro presos políticos estão em greve de fome - http://www.redeangola.info/quatro-presos-politicos-estao-em-greve-de-fome/
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