Como deve ser do conhecimento
geral, sob orientação da Presidência da República, realizou-se em Luanda um seminário
que deveria ter reflectido de forma participativa sobre a problemática da
ocupação de terras em Angola.
A OMUNGA, enquanto parte
interessada no assunto e não tendo podido participar no mesmo, por motivos de
agenda, mesmo tendo recebido o convite da organização, decidiu emitir os seus
pareceres publicamente tomando em consideração o comunicado final.
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REF.ª: OM/__111___/2014
Lobito, 05 de Dezembro de 2014
NOTA PÚBLICA
SEMINÁRIO NACIONAL SOBRE A
PROBLEMÁTICA DA OCUPAÇÃO DE TERRENOS
De 01 a 02 de Dezembro de 14,
realizou-se em Luanda o Seminário Nacional sobre a Problemática da Ocupação de
Terrenos, organizado pelos Ministérios da Administração do Território, Urbanismo
e Habitação e da Justiça e Direitos Humanos, sob orientação da Casa Civil da
Presidência da Republica.
De acordo aos organizadores teve como objectivo “diagnosticar a situação
actual da ocupação de terrenos em Angola, proceder ao balanço dos 10 (dez) anos
de vigência da Lei de Terras e do Ordenamento do Território e Urbanismo e
assegurar uma ampla participação de todos interessados na discussão da matéria,
com vista a uma tomada de decisão.”
A OMUNGA agradece o convite
que lhe foi formulado e expressa o seu pedido de desculpas pela sua
indisponibilidade de agenda para poder ter estado presente.
A Associação OMUNGA reconhece
que encontros deste género podem revestir-se de importância desde que pretendam
realmente tomar medidas que permitam a definição de políticas que respeitem e
garantam o exercício por todos os cidadãos do direito à terra e à habitação
condigna. Esperamos também que a interpretação e implementação das Conclusões e
Recomendações expressas no Comunicado Final não venham a prejudicar e a
criminalizar mais as populações mais carenciadas do país, quer a nível urbano
como rural e que não venha a servir de ferramenta para a protecção apenas dos
grandes interesses económicos.
Em primeiro lugar, foi com
enorme preocupação que a OMUNGA não viu qualquer referência às terras comunitárias.
Não se descreve as razões porque até hoje tão poucos processos de reconhecimento
de terras comunitárias tiveram a concessão de títulos e muito menos porque não
se fala em cadastro de todas as terras consideradas actualmente como
comunitárias e a definição justa e digna das terras a serem tituladas enquanto
comunitárias. Esta falha grave pode demonstrar um desprezo ao estabelecido na
lei.
Por outro lado, a continuidade
de utilização de termos como “zonas de risco” servem apenas para
não se dizer absolutamente nada. Todos sabemos que milhares de pessoas viram as
suas casas demolidas e foram desalojadas em Luanda, Lubango e outras
localidades, sob a justificação de ocuparem “zonas de risco”. No
entanto, acompanhamos em seguida o surgimento nesses locais de enormes
projectos urbanísticos para classes ricas. A OMUNGA compreende, que se deva
esclarecer o que significa “zona de risco” e para quem. Muitas
das citadas “zonas de risco” apenas o são tomando em conta a fraca qualidade
das habitações das populações, como a falta de urbanidade e planos
urbanísticos. Nestes casos devem-se tomar em ponderação projectos de
requalificação para as próprias comunidades em vez da sua transferência para
outras áreas.
Já o termo “ocupação
ilegal de terrenos” deve também ser humanamente reflectido. Lembramos
que ancestralmente e para as populações rurais, a ocupação de terrenos nunca
foi ilegal, já que a terra existe para todas as pessoas, a não ser que já fosse
anteriormente ocupada. Como está expresso no comunicado final, a grande
migração do campo para a cidade, é o factor principal para a denominada
“ocupação ilegal”. Portanto, embora aceitemos que existem pessoas de má fé
envolvidas em muitos processos de ocupação de terrenos, incluindo e
fundamentalmente, autoridades tradicionais e funcionários das administrações,
não se pode generalizar esta conclusão.
Aconselhamos que deve haver na
realidade a responsabilização dos envolvidos no processo de autorização e
venda, pertencentes aos quadros administrativos do Estado e às autoridades
tradicionais e não tanto as vitimas que muitas vezes vêem extorquidos os seus
parcos recursos. Entretanto deve-se desenvolver uma importante campanha de
informação sobre o direito à terra e divulgação do pacote legislativo
relacionado ao assunto.
E importante este
esclarecimento porque esse Seminário recorre, sem descrição e de forma bastante
criminalizadora das comunidades mais pobres, à “responsabilização civil e
criminal.”
Infelizmente, também não se viu
a verdadeira reflexão sobre a “ocupação ilegal” de terrenos por
parte dos detentores de poder que utilizando dos seus cargos apoderam-se de
milhares e milhares de hectares de terras por este país afora.
A título de exemplo, a
apropriação de milhares e milhares de hectares por parte do Dr. Juiz presidente
do Tribunal Constitucional[1], do
Director Nacional do Património do Estado[2] ou do
Governador do Kwanza Sul[3] deve
sim, ser considerada “ocupação ilegal” com a devida
responsabilização dos 3 aqui enfocados, incluindo o Ministro da Agricultura por
emissão da devida autorização, como a revogação de todas as decisões favoráveis
deste género.
A OMUNGA acredita plenamente
que o problema de ocupação de terrenos está estreitamente ligado ao elevado
índice de corrupção que se vive em Angola. Lembrar que Angola foi recentemente
considerado o pior país da lusofonia no que se refere a corrupção e ocupa agora
o 161ª posição da tabela da Transparência Internacional, tendo baixado 19
lugares desde 2013.
Só a vontade política da
Presidência da Republica de desenvolver um combate sem tréguas à corrupção em
Angola, pode acabar de forma sustentável com este problema de ocupação de
terrenos e muitos outros graves problemas de que enferma actualmente o pais e
os angolanos.
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José A. M. Patrocínio
Coordenador
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