18/12/2014

OMUNGA E DOMINGOS DA CRUZ EMITEM CARTA ABERTA


REF.ª: OM/__117__/2014
Lobito, 18 de Dezembro de 2014



À
Presidência da República de Angola

L U A N D A


ASSUNTO: CARTA ABERTA: ANGOLA NO CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU E O 66º ANIVERSÁRIO DA DUDH


A associação Omunga e o professor Domingos da Cruz acompanharam com interesse todo o processo de candidatura e de eleição de Angola para membro não permanente do Conselho de Segurança da ONU.

Consideram este cargo como de extrema responsabilidade e o reflexo da política de Angola no que se refere à manutenção da Paz em todo o planeta, começando pelo nosso próprio território, num momento em que Angola foi revista recentemente no Processo de Revisão Periódica Universal do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas.

Por tal razão, não poderiam deixar de recomendar à Presidência da República, o seguinte:

1 – PAZ E SEGURANÇA EM ANGOLA

1.1   – DIREITO À VERDADE E À MEMÓRIA COLECTIVA
Como todos sabemos, na maioria do território nacional, as armas que opunham o governo e a UNITA calaram-se em 2002, com os acordos entre as duas partes que se seguiu à morte do então líder da UNITA, Jonas Malheiro Savimbi.

Este novo período permitiu a livre circulação de pessoas e bens, a reabilitação e construção de infraestruturas, o crescimento económico e, essencialmente, a esperança de todos os angolanos de verdadeira reconciliação e de participação na construção de um país para todos com justiça social e verdadeira democracia.

Infelizmente, estas expectativas têm vindo a ser destruídas, dia após dia pelas políticas económicas, sociais e culturais que têm vindo a ser adoptadas ou negadas pela Presidência da República. Por outro lado, somos obrigados a entender esse calar das armas exclusivamente ao “arquitecto” da Presidência da República, como se os milhares de angolanos mortos, de órfãos, de viúvas, de deficientes que deambulam pedintes pelas ruas das cidades, em nada tivessem contribuído para tal.

Ao mesmo tempo que temos vindo a confrontar-nos cada vez mais com escândalos internacionais que envolvem nomes importantes do poder angolano ou ligados a este, incluindo de parentes do Sr. Presidente da República, não vemos qualquer explicação da parte da Presidência da República, muito menos, de qualquer processo investigatório.

Continuamos a confrontar-nos com denúncias de intolerância política, que envolvem casos de agressão e mesmo assassinatos, de acordo a inúmeras notícias postas a circular especialmente nas redes sociais, sem que o judiciário intervenha.

Enquanto de forma criminosa e silenciosa vamos acompanhando a situação de fome de milhares e milhares de concidadãos, principalmente nas províncias do sul, continuamos também a maltratar as minorias, como sejam os nossos concidadãos pertencentes ao grupo étnico Khoisan, que há quem afirme serem os “descendentes dos primeiros humanos modernos[1] e serem “os primeiros povos que habitaram Angola na Proto-História (é o período da Pré-História anterior à escrita, que compreende a idade dos metais)[2].

Ninguém está esquecido também, do processo viciado de revisão e aprovação da nova constituição. Esse processo, desrespeitou a verdadeira expectativa florescida com os denominados acordos de paz de 4 de Abril de 2002.

Ao mesmo tempo que sentimos negada a expectativa de milhares de cidadãos de verem a possibilidade de exercerem os seus direitos de participação, através das autarquias há tanto adiadas ao vento de interesses inconfessos. Foi assim, e mais uma vez, durante o último discurso sobre o estado da nação proferido a 18 de Outubro de 2014, durante a reunião solene de abertura da III sessão legislativa da III legislatura da Assembleia Nacional[3].

Ao mesmo tempo que, vamo-nos deparando com os cada vez mais conflitos de terras entre os camponeses e entidades públicas e privadas que têm intervido em desrespeito ao direito das terras ancestrais e comunitárias, vamos continuando a assistir a demolições e desalojamentos forçados de milhares de cidadãos, um pouco por todas as cidades do país.

Por outro lado, enquanto assistimos à adulteração do direito à informação com a manipulação da imprensa vamos também assistindo à violência e detenção de jovens que, tão somente, pretendem exercer o seu direito à manifestação.

Apenas para podermos terminar, como se de brincar aos adivinhos se tratasse, tem sido veiculado na média e redes sociais sobre hipotéticas possibilidades de sucessão de José Eduardo dos Santos no cargo de Presidente da República, chegando mesmo a ser apontada uma possível sucessão parental.

RECOMENDAÇÕES
Pela síntese da situação apresentada, é lógico que vivemos num país aonde a violência e a criminalidade vão crescendo assustadoramente e aumenta o medo dos angolanos perante a incerteza do futuro de suas vidas, por isso, recomendamos:
a)       Processo verdadeiramente participativo de revisão constitucional que permita construir-se a verdadeira paz e reconciliação nacional em busca da verdade, da memória colectiva e da real cidadania;
b)       Marcação do calendário para a implementação, a nível de todo o território nacional, das autarquias;
c)       A imediata despartidarização das instituições do Estado;
d)       A independência imediata do judiciário;
e)       Definição e implementação participativa, de políticas públicas inclusivas e que garantam a melhoria da qualidade de vida dos grupos mais desfavorecidos da população[4];


1.2   – QUESTÃO DE CABINDA E DAS LUNDAS
Infelizmente, conforme correm informações, a situação militarista e de ameaça continua a ser cenário em Cabinda para com os cabindenses.

Embora o direito à associação e à manifestação seja também limitado em todo o território nacional, em Cabinda, estes e outros direitos e como as liberdades, são mais brutalmente reprimidos.

As denúncias graves sobre as violações dos direitos humanos nas Lundas inclusive por empresas de segurança privadas, têm sido de forma cúmplice silenciadas pelo judiciário enquanto se tenta criminalizar jornalistas e defensores de direitos humanos que tentam investigar, divulgar e denunciar tais graves violações.

RECOMENDAÇÕES
Pela síntese que expusemos, é obvio que, que a situação de insegurança é ainda mais grave e perigosa nestas regiões, pelo que recomendamos:
a)       Trazer urgentemente para a agenda política nacional, sem tabus e de forma aberta, a discussão sobre a situação e caminhos de real paz e reconciliação para as regiões de Cabinda e das Lundas

2         - PROTECÇÃO DOS CIDADÃOS NACIONAIS EM ZONAS DE CONFLITO: CASO DOS ESTUDANTES NA UCRÂNIA
É responsabilidade de todo e qualquer Estado, garantir a protecção e a segurança dos seus cidadãos. Infelizmente temos acompanhado o abandono injustificado dos cidadãos angolanos que se encontram a estudar na Ucrânia pondo em risco a sua segurança e o direito à vida e dignidade.

RECOMENDAÇÕES
Pelo exposto, os concidadãos angolanos na Ucrânia vivem uma situação de insegurança, pelo que recomendamos:
a)       Que o estado angolano negoceie no sentido de que os cidadãos angolanos não sejam envolvidos nem afectados pelo conflito
b)       Negociar imediatamente um processo de retirada dos estudantes angolanos da Ucrânia e transferidos para qualquer outro país com maior facilidade de adaptação e de conclusão dos seus estudos



3         - MISSÕES DE PAZ E INTERVENÇÃO EM OUTROS PAÍSES
Infelizmente não foram poucas vezes que os angolanos foram apanhados de surpresa com informações de existência em diversos países e diversos conflitos, militares angolanos.

Recentemente, mais uma vez fomos surpreendidos com o discurso do Ministro das Relações Exteriores sobre o compromisso de Angola em integrar o contingente das Nações Unidas na República Centro Africana (RCA)[5]

RECOMENDAÇÕES
Pelo exposto no resumo acima, continuamos a viver situações de insegurança com respeito aos militares angolanos em missões no exterior, pelo que somos a recomendar:
a)       Que a Presidência da República cumpra com os pressupostos mais elementares de trazer à discussão pública e obrigatoriamente à Assembleia Nacional, sobre o envio de militares angolanos e a participação em toda e qualquer missão de paz seja a nível regional como internacional

4         - MENINAS DA NIGÉRIA
Todo o mundo tem acompanhado o rapto das 200 meninas da Nigéria a 14 de Abril de 2014 que até hoje continuam em parte incerta.

RECOMENDAÇÕES
a)       Apoiar todo o processo negocial que permita terminal com a libertação de todas as meninas raptadas.

5         - A INVASÃO À SÍRIA
O conflito Sírio prolonga-se desde 2011 e envolve diferentes actores apoiados por diferentes interesses. Diante de tal situação que se prolonga, recomendamos:
a)       Que Angola leve novamente a debate este conflito para o Conselho de Segurança, mas com uma proposta concreta, tendo em conta os esforços diplomáticos anteriores;
b)       Que Angola desenvolva os esforços pelo reconhecimento da luta do povo Curdo pela sua autodeterminação.


6         - RELAÇÕES COM ISRAEL E RECONHECIMENTO DO ESTADO DA PALESTINA
Desde 1947 que se pretende a implementação das decisões sobre o reconhecimento do Estado da Palestina.

Infelizmente, contrariando todas as decisões, recomendações e resoluções, os sucessivos governos de Israel têm obstaculizado esse processo, aumentando a sua escalada ocupacionista.

Felizmente temos visto ultimanente vários países aprovarem pelos seus governos e parlamentos, o reconhecimento do Estado da Palestina.

RECOMENDAÇÕES
Pelo exposto, a arrogante posição do estado de Israel, coloca em perigo a Paz mundial, pelo que recomendamos:
a)       Chamar  o embaixador de Israel em Angola para transmitir o descontentamento de Angola em relação à continua agressão e ocupação de territórios palestinos;
b)       Renegociar os acordos com Israel no campo militar  e de segurança nacional enquanto aquele estado continuar com a política ocupacionista;
c)       Propor medidas legais que proíbam imediatamente a importação de produtos agrícolas e outros produzidos por Israel nos territórios palestinos ocupados;
d)       Aprovar imediatamente o reconhecimento por parte de Angola do Estado da Palestina

7- DA CRISE POLITICA NO BURKINA FASO
Diante da pretensão do Presidente Burkinabe de alterar a Constituição para continuar no poder, o povo desencadeou uma insurreição que forçou a sua saída. Nesta conjuntura, claramente ligada as questões de paz e segurança, recomendamos:
a)       Que o governo angolano, seja parte dos esforços da comunidade Burkinabe e regional, no quadro multilateral, com vista a transição para uma regime civil e verdadeiramente democrático.

José A. M. Patrocínio
Coordenador da OMUNGA

Domingos da Cruz
Professor



[1] KHOISAN SÃO OS DESCENDENTES DIRECTOS DOS PRIMEIROS HUMANOS MODERNOS, artigo de 21 de Setembro de 2012 no site Ciência Hoje, http://www.cienciahoje.pt/index.php?oid=55619&op=all (consultado a 24 de Outubro de 2014)
[2] Legenda de foto partilhada a 16 de Maio de 2012 na página do facebook de ANGOLA MINISTRY OF CULTURE PICTURES & EVENTS, https://www.facebook.com/permalink.php?story_fbid=306080872805297&id=150849848265087 (consultado a 24 de Outubro de 2014)
[3] ANGOLA: MENSAGEM DO PR SOBRE O ESTADO DA NAÇÃO – CONSTITUI DESTAQUE publicado a 18 de Outubro de 2014 no Portal Angop, http://www.portalangop.co.ao/angola/pt_pt/noticias/politica/2014/9/42/Angola-Mensagem-sobre-estado-Nacao-constitui-destaque,35b8006d-2ea0-4c7c-974b-45bd171d40fa.html (consultado a 24 de Outubro de 2014)
[4] ONU PEDE COMPROMISSO COM MARGINALIZADOS E VULNERÁVEIS – Mensagem de Ban Kin-moon para o dia das Nações Unidas, postado na página da ONU Brasil a 24 de Outubro de 2014, http://unicrio.org.br/convoco-governos-e-individuos-para-trabalhar-em-uma-causa-comum-para-o-bem-comum-diz-ban-ki-moon/  (consultado a 24 de Outubro de 2013)
[5] OPOSIÇÃO ANGOLANA QUER ESCLARECIMENTOS SOBRE O ENVIO DE TROPAS PARA A REPÚBLICA CENTRO AFRICANA, publicado a 25 de Outubro de 2014, em Política de ÁFRICA 21 Digital, http://www.africa21digital.com/politica/ver/20040050-oposicao-angolana-quer-esclarecimentos-sobre-o-envio-de-tropas-para-a-republica-centro-africana (consultado a 24 de Outubro de 2014)






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