17/08/2010

OMUNGA: CARTA ABERTA A ALBERTO NGONGO - ADMINISTRAÇÃO E MPLA, QUEM É QUEM NO PROCESSO DA FEIRA DO LOBITO?

REF.ª: OM/ __ 203 __ /10
LOBITO, 12 de Agosto de 10
C/c: Exmo. Sr. Presidente da República de Angola – LUANDA
Exmo. Sr. Presidente da Assembleia Nacional – LUANDA
Exma. Sra. Ministra da Justiça – LUANDA
Exma. Sra. Ministra da Comunicação Social – LUANDA
Exmo. Sr. Ministro da Administração do Território – LUANDA
Exmo. Sr. Procurador geral da República – LUANDA
Exmo. Sr. Secretário de Estado para os Direitos Humanos – LUANDA
Exmo. Sr. Provedor de Justiça – LUANDA
Exmo. Sr. Relator Especial para os Defensores de Direitos Humanos das Nações Unidas – Genebra
Exma. Sra. Relatora Especial para o Direito à Habitação Adequada – Genebra
Exma. Sr. Comissário para os deslocados internos da Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos – Banjul
Exmos. Srs. Membros do Conselho Nacional da Comunicação Social – LUANDA
Exmo. Sr. Juiz Presidente do Tribunal Constitucional – LUANDA
Exmo. Sr. Juiz Presidente do Tribunal Supremo – LUANDA
Exmo. Sr. Juiz Presidente do Tribunal de Contas – LUANDA
Exmos. Srs. Moradores da Feira do Lobito – LOBITO

Ao Exmo. Sr.
Alberto Ngongo
Att: Chefe da Repartição Social da Circunscrição da Administração Municipal do Lobito e Secretário para a Informação do Comité Municipal do MPLA do Lobito
L O B I T O

CARTA ABERTA: ADMINISTRAÇÃO E MPLA, QUEM É QUEM NO PROCESSO DA FEIRA DO LOBITO?

Os nossos melhores cumprimentos.


A associação OMUNGA tem vindo a acompanhar com muita preocupação, os mais variados pronunciamentos de pessoas e instituições, em relação ao processo da Feira do Lobito que envolve os seguintes aspectos:

1 – Verdadeiro proprietário do recinto e instalações da Feira do Lobito: Administração Municipal do Lobito ou MPLA?
2 – Fim social do recinto da Feira do Lobito: Espaço público de entretenimento ou privado de hotelaria?
3 – Assentamento das populações que vivem actualmente no recinto da Feira do Lobito: Responsabilidade do Estado pelo respeito dos Direitos e Dignidade Humana, ou uma acção de caridade com fins propagandísticos?

Gostaríamos de passar à análise dos aspectos anteriormente enunciados:

1 – Verdadeiro proprietário do Recinto e instalações da Feira do Lobito

Como todos sabemos, a Feira do Lobito sempre foi um espaço público de entreteniento e portanto um património colectivo. Durante o período que vivemos pós independência e de sistema político de partido único, aquele espaço passou a designar-se como feira do partido. Tal aconteceu, na altura, já que o “partido” (MPLA) era ao mesmo tempo o governo e o Estado.

Com a constituição da II República, onde foram imprimidas várias alterações, foi revisto o sistema político nacional, passando a vivermos num Estado pluri-partidário. Esta mudança não deve ser vista como algo abstrato, mas reflecte-se na prática com revisão de processos. Como estabelece a lei, qualquer assumpção de proprietário deve ser argumentada por documentação legal que lhe transfere tal poder e direitos subjacentes. Esta é a razão que leva o actual Executivo angolano em considerar que deve demoliar milhares de residências, desalojando milhares e milhares de pessoas, argumentando a sua ilegalidade.

Por isso, parece-nos estranho que continuemos a verificar posicionamentos que de forma pouco transparente, pretendem conferir legitimidade ao partido MPLA como proprietário do referido recinto e instalações. Pior ainda, verificamos o silêncio das instituições do Estado, responsáveis pelo respeito da legalidade e protecção do Estado de Direito e Democrático, em relação a este assunto.

Por várias vezes a OMUNGA exigiu a publicação da devida documentação que legitima o MPLA enquanto proprietário da citada Feira do Lobito, sem que tal acto tenha até hoje acontecido.

Assim sendo, e sempre considerando os interesses colectivos na protecção do património público, somos a considerar a Feira do Lobito enquanto espaço público a ser defendido em nome do bem comum.

2 – Fim social do recinto da Feira do Lobito

Obviamente que entendemos que, quando possam existir beneficícios concretos para a colectividade, se possa aceitar a alienação de património público em favor de entes privados. Esta decisão baseia-se sempre na avaliação do balanço entre os ganhos e perdas para a colectividade.

A cidade do Lobito perdeu definitivamente todos os espaços públicos, como praças, jardins, viveiros municipais, recintos destinados à prática desportiva, etc, sendo-lhes dirigido outros fins sociais como seja a construção de supermercados, prédios, restaurantes, etc.

A Feira do Lobito resta como o único e último espaço da cidade do Lobito que pode vir a ser utilizado como espaço colectivo para entretenimento. Ao se pretender destruir tal espaço e transformá-lo num hotel, deixaremos de beneficiar toda a colectividade e passar a beneficiar apenas algumas pessoas sem qualquer alternativa compensatória.

Deve-se aqui entender, como direito colectivo o direito à cidade por parte de todos os cidadãos. Direito este que a OMUNGA tem vindo a defender ao exigir o respeito pelos cidadãos e a defesa da manutenção da Feira do Lobito enquanto espaço de todos com o fim social de entretenimento.

3 – Assentamento das populações que vivem actualmente no recinto da Feira do Lobito

Como é do conhecimento de todos, vivem no recinto e instalações da Feira do Lobito, centenas de cidadãos em condições desumanas.

O Estado angolano tem responsabilidades para com os seus cidadãos no que se refere à garantia e protecção dos seus direitos. Por tal razão, é obrigação do Estado criar condições de habitabilidade para estas pessoas, independentemente de se pretender ou não reabilitar a Feira do Lobito. A actual situação em que vivem as referidas pessoas, já é em si uma responsabilidade do Estado, por não ter criado as devidas condições de habitabilidade.

Considerando a análise acima, enquanto ponto de partida, devemos agora analisar sobre quais deverão ser as responsabilidades do Estado em relação ao processo de desalojamento, deslocação e assentamento de todos estes cidadãos.

O delineamento de todo este processo deve tomar em conta, entre outros, diferentes aspectos como sejam a participação dos cidadãos, as condições de realojamento, o acesso a serviços, a garantia da protecção jurídica, etc.

Embora já consideremos um avanço no procedimento de desalojamento das pessoas, havendo já a garantia de que não será utilizada a força, ser-lhes-á disponibilizado terreno em zona urbanizada, com a cesso a serviços e a garantia da protecção jurídica, continuamos a não verificar qualquer mudança no que se refere à sua participação. Por tal razão ainda não foram avançados prazos nem tão pouco poderam os interessados ter contacto quer com o local de assentamento nem com o referido projecto de urbanização.

Pelo exposto, devemos entender que o assentamento condígno dos moradores da Feira do Lobito, é uma responsabilidade do Estado angolano e não deve vir a ser manipulado enquanto acção propagandística partidária.

Chamamos à atenção deste facto porque, mais uma vez, o processo de desalojamento da Feira do Lobito é-nos apresentado como dúbio. A 10 de Agosto de 2010, no site do Jornal de Angola aparecem duas notícias que envolvem o Exmo. Sr. Alberto Ngongo e referem-se à mesma actividade: encontro com os moradores da Feira do Lobito a 08 de Agosto de 2010. São eles:

Administração do Lobito atribui terrenos para moradias: Aqui o Exmo. Sr. Alberto Ngongo aparece como Chefe da Repartição Social da Administração do Lobito a falar à margem do encontro da direcção do MPLA com os moradores da Feira do Lobito, e
MPLA critica postura dúbia no serviço de organizações: Aqui, o Exmo. Sr. Alberto Ngongo aparece como Secretário para a informação do Comité Municipal do MPLA a falar durante um encontro da direcção do MPLA com os moradores da Feira do Lobito

Afinal o Exmo. Sr. Alberto Ngongo representava a Administração Municipal do Lobito ou o MPLA durante o encontro com os moradores da Feira do Lobito? As promessas de terreno foram apresentadas enquanto garantias da Administração Municipal do Lobito ou promessas do MPLA? Achamos muito importante que se analise tais intervenções, razão pela qual voltamos a solicitar a intervenção de todas as instituições do Estado no sentido de esclarecem publicamente a situação.

Por último queremos frisar e deixar claro que a OMUNGA continuará a desenvolver as suas acções, enquanto uma associação de defesa de direitos humanos, não cedendo a nenhum tipo de ameaças nem de intromissões abusivas, resguardando-se sempre no respeito pela lei.


Tomando em conta que o Exmo. Sr. Alberto Ngongo (Chefe da Repartição Social da Administração do Lobito e Secretário para a Informação do Comité municipal do MPLA do Lobito) dará a devida atenção ao exposto e responderá às preocupações aqui trazidas, aceite as nossas cordiais saudações.


José A. M. Patrocínio
Coordenador Geral

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