18/06/2010

CARTA A JOSÉ EDUARDO DOS SANTOS (IV Acampamento de defensores de direitos humanos - 7 a 10 de Junho/Benguela)

À
Sua Excelência
Engº José Eduardo dos Santos
Presidente da República de Angola

L U A N D A


Assunto: CARTA ABERTA SOBRE DEMOLIÇÕES E DESALOJAMENTOS FORÇADOS EM ANGOLA

Excelência,
Os participantes do IV Acampamento de Defensores de Direitos Humanos dos países africanos de língua oficial portuguesa, realizado de 7 a 10 de Junho de 2010, em Benguela, Angola, tomaram, com preocupação, conhecimento sobre as acções de demolições, desalojamentos forçados e expropriações indevidas de terras. Para além de Angola, estavam representados defensores de direitos humanos do Brasil, Moçambique e São Tomé e Príncipe.

“Entre 2001 e 2007, organizações locais e internacionais documentaram o desalojamento forçado de mais de 30.000 pessoas. Uma parte delas viu as suas casas serem demolidas sem ser avisada nem consultada e sem protecção legal nem habitação alternativa adequada. Muitos desalojamentos foram executados com recurso a agentes da polícia, membros das forças armadas ou de empresas de segurança privada, com uso excessivo da força.”

Em Julho de 2009, cerca de 3.000 casas foram demolidas no Município do Kilamba Kiaxi, em Luanda, o que significou o desalojamento de pelo menos 3.000 famílias. O mesmo número de residências foram demolidas em Março de 2010 na cidade do Lubango, província da Huíla.

No entanto congratulam-se também com o facto do Exmo. Sr. Ministro da Administração do Território, representando Sua Ex.ª Sr. Presidente, a 4 de Abril deste ano, na cidade de Menongue, ter formulado publicamente um pedido de desculpas às cerca de 3.000 famílias desalojadas em Março na cidade do Lubango, assim como tendo assumido um compromisso do Estado angolano não voltar a realizar tal tipo de acções.

Contrariando tal posicionamento, tomamos conhecimento que demolições, desalojamentos forçados e expropriações indevidas de terras, continuam a ocorrer um pouco por todo o país, como por exemplo no Lobito, Cacuaco, Chibia e Huambo.

Recordamos que, no ponto 1 da Observação Geral N.º 7, o Comité dos Direitos Económicos, Sociais e Culturais “chegou à conclusão de que os desalojamentos forçados são prima facie incompatíveis com os requisitos do Pacto” (entenda-se Pacto Internacional dos Direitos Económicos, Sociais e culturais, de que Angola é signatária).

Os participantes apelam ao executivo Angolano, atendendo à sua responsabilidade assuma:
1 – Apoiar o processo de investigação e de responsabilização criminal e disciplinar de quem dirigiu tais acções;
2 – Implementar as medidas compensatórias justas para apoio às vítimas das demolições e expropriações;
3 – Criar condições dignas e urgentes de reassentamento, incluindo o acesso aos títulos de propriedade, condições de habitabilidade, acesso a serviços e fontes de rendimentos e sobrevivência.
4 - Dar especial atenção a grupos mais vulneráveis como crianças, idosos, pessoas com deficiência, mulheres grávidas, etc.;
5 – Criar as condições para que todos os processos jurídicos pendentes de queixas das vítimas de demolições e expropriações, culminem com a compensação das vítimas;
6 – Parar com todas as demolições em Angola até que seja aprovada a legislação apropriada que garanta que a acção de despejo seja a última saída e que defina, especificamente, as circunstâncias relevantes e as salvaguardas para o momento em que a acção de despejo for levada a cabo;
7 – Convidar a Relatora Especial da ONU para o Direito à Habitação Adequada, Sra. Raquel Rolnik, para que visite Angola, e possa dar a sua assistência, como parte do esforço para garantir um padrão de vida digno, ao processo de criação ou reforma de legislação e políticas para as adequar aos padrões internacionais;


Na expectativa do solicitado ser acolhido por Vossa Excelência, subscrevemo-nos com elevada estima e consideração.

Atenciosamente,


CC:
Presidente da União Africana
Relatora Especial para o Direito a Habitação da ONU
Os participantes:

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